Verba Legis 2022

JURISPRUDÊNCIA

 

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA.

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA Nº 0000615-73.2016.6.09.0000 - GOIÂNIA/GOIÁS
Relatora : Desembargadora Amélia Martins de Araújo
Redator : Desembargador Itaney Francisco Campos
Publicação : DJE - Diário de Justiça Eletrônico
Data : 13/10/2022


DECISÃO MONOCRÁTICA

 

Cuida-se de prestação de contas apresentada pelo DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES, relativa às Eleições de 2016, em que foi cominada penalidade de suspensão parcial de cotas do Fundo Partidário por 12 meses (cinquenta por cento), além de devolução ao erário do valor de R$ 22.589,74 (vinte e dois mil, quinhentos e oitenta e nove reais e setenta e quatro centavos), nos termos do art. 68, III e §§ 3º e 5º, c/c art. 72, §1º, da Resolução TSE nº 23.463/2015, e nos moldes do acórdão regional (ID 36303840, fls 309-311 e ID 36303890, fls 312-320) além da decisão de ID 36304390, fls. 471-477.

Na fase de cumprimento de sentença, após apresentação de petição da agremiação partidária, esta Presidência proferiu a decisão ID 37000781, a qual deferiu o parcelamento do débito em 60 vezes e fixou o termo inicial de incidência de juros e correção monetária, a partir do trânsito em julgado do Acórdão, ocorrido em 26/6/2021 (ID 36304690).

Em razão disso, a União, após cumprimento parcial da obrigação pelo partido, peticionou (ID 37034589) sustentando que a correção monetária e os juros devem ser contados desde o fato gerador, que, no caso, seria o último mês do ano fiscal da prestação de contas (12/2016), período a partir do qual restaria caracterizado o descumprimento da obrigação.

Aduz que “não obstante esteja o Diretório Nacional seguindo a orientação da parte final do despacho de id 37000781, tratando-se de prestação de contas referente à campanha eleitoral de 2016, necessário ressaltar que o art. 71, §2º, da Resolução TSE nº 23.464/2015 determina que "incidirão juros moratórios e atualização monetária, calculados com base na taxa aplicável aos créditos da Fazenda Pública, sobre os valores a serem recolhidos ao Tesouro Nacional, desde a data da ocorrência do fato gerador até a do efetivo recolhimento, salvo se tiver sido determinado de forma diversa na decisão judicial".

Intimado para se manifestar sobre o pedido formulado pela União, o Diretório Estadual do Partido dos Trabalhadores quedou-se inerte, conforme certidão ID 37162279.

É o breve relato.

Decido.

Primeiramente, convém mencionar os seguintes fatos previamente definidos para o pagamento:

1 - houve o deferimento do pleito do partido para o fracionamento do débito de R$ 22.589,74 (vinte e dois mil, quinhentos e oitenta e nove reais e setenta e quatro centavos), em 60 (sessenta) parcelas mensais, a serem descontadas dos futuros repasses do Fundo Partidário.

2 - referido valor deve ser devidamente atualizado, acrescendo-se a cada parcela os juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC) para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir do mês subsequente ao da publicação da decisão até o mês anterior ao do pagamento, acrescido de 1% (um por cento) relativamente ao mês em que o pagamento estiver sendo efetuado, nos termos do art. 59, § 4º, III, da Resolução TSE nº 23.604/2019, artigo 11, § 11 da Lei nº 9.504/97 c/c arts. 10 e 13 da Lei nº 10.522/2012.

3 - a quantia a ser recolhida é decorrente da utilização indevida de verbas do fundo partidário pelo Diretório Estadual do Partido dos Trabalhadores, relativa à campanha de 2016, consoante delimitado no Acórdão ID 36303890, que transitou em julgado em 26/6/2021 (ID 36304690).

A par dessas circunstâncias, importa mencionar que a prestação de contas dos partidos referente às Eleições de 2016 é regulamentada pela Resolução TSE nº 23.463/2015, que dispõe nos seguintes termos:

Art. 72. A aprovação com ressalvas da prestação de contas não obsta que seja determinada a devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou a sua transferência para a conta única do Tesouro Nacional, assim como dos recursos de origem não identificada, na forma prevista nos arts. 25 e 26.

§ 1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de cinco dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União para fins de cobrança.

§ 2º Na hipótese do § 1º, incidirão juros moratórios e atualização monetária, calculados com base na taxa aplicável aos créditos da Fazenda Pública, sobre os valores a serem recolhidos ao Tesouro Nacional, desde a data da ocorrência do fato gerador até a do efetivo recolhimento, salvo se tiver sido determinado de forma diversa na decisão judicial. (Original sem grifos).

A referida norma fora reproduzida pela Resolução TSE 23.607/2019, que atualmente dispõe sobre a prestação de contas nas eleições, e estabelece, in verbis:

Art. 79. A aprovação com ressalvas da prestação de contas não obsta que seja determinada a devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou a sua transferência para a conta única do Tesouro Nacional, assim como dos recursos de origem não identificada, na forma prevista nos arts. 31 e 32 desta Resolução.

§ 1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia- Geral da União, para fins de cobrança.

§ 2º Na hipótese do § 1º, incidirão juros moratórios e atualização monetária, calculados com base na taxa aplicável aos créditos da Fazenda Pública, sobre os valores a serem recolhidos ao Tesouro Nacional, desde a data da ocorrência do fato gerador até a do efetivo recolhimento, salvo se tiver sido determinado de forma diversa na decisão judicial. (Original sem grifos).

No presente caso, porém, esta Corte Eleitoral, conforme permissivo da parte final dos citados §§ 2º, entende, diversamente do alegado pela União, que o trânsito em julgado da sentença ou Acórdão (fato gerador) é o marco pelo qual os recursos passam a ser considerados ilícitos.

Vale dizer, antes de uma decisão proferida pela Justiça Eleitoral não se pode falar em ilicitude do gasto ou arrecadação da verba pública. Por essa razão, a incidência de juros e correção monetária, em valores devidos à União, decorrentes da indevida utilização de recursos do fundo partidário, como ocorreu no caso em questão, deve ocorrer a partir do trânsito em julgado do Acórdão que determinou a devolução da quantia de R$ 22.589,74 ao Tesouro Nacional, nos termos determinados na decisão ID 37000781.

Por pertinentes, colhem-se da jurisprudência dos Tribunais Eleitorais as seguintes ementas:

AGRAVO INTERNO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2018. Trata-se de agravo interno interposto pela Advocacia-Geral da União em face da decisão interlocutória 8038595, que determinou a incidência de juros de mora e correção monetária somente a partir do trânsito em julgado do acórdão, que ocorreu em 13/12/2019. Entendo diversamente da interpretação da Advocacia-Geral da União a qual sustenta que incidem juros a partir da ocorrência do fato gerado, com base na Resolução n. 23.553/2017/TSE, pois o recolhimento dos recursos de origem não identificada é devido a partir do trânsito em julgado da decisão que assim o reconheceu, uma vez que, antes de uma decisão, aqueles recursos eram supostamente lícitos para o prestador de contas. A meu juízo, a sentença ou acórdão é o marco pelo qual os recursos passam a ser considerados ilícitos. Antes de uma decisão proferida pela Justiça não se pode falar em ilicitude de arrecadação. Há uma similaridade com a sentença proferida em ação ordinária por danos morais, uma vez que, neste caso, o Juiz condena o réu a pagar certa quantia e esse valor é devido a partir do trânsito em julgado dessa decisão, isto é: nas ações indenizatórias por dano moral o valor é devidamente atualizado quando da sentença ou do acórdão, não havendo que se falar em retroação da incidência da correção monetária, sob pena de enriquecimento ilícito. Inexistência de dúvidas que incidem juros de mora e correção monetária sobre os valores referentes à condenação. Reconhecimento da incidência de juros de mora e correção monetária a partir do trânsito em julgado do Acórdão (13/12/2019). AGRAVO INTERNO A QUE SE NEGA PROVIMENTO PARA MANTER A DECISÃO MONOCRÁTICA. Após o trânsito em julgado, enviem os autos à Coordenadoria Contábil e Financeira que deverá efetuar os cálculos, com incidência da taxa Selic a partir do trânsito em julgado do Acórdão, que ocorreu em 13/12/2019. (TRE/MG. Prestação de Contas nº 060324741, Acórdão de 31/3/2020, Relator Juiz Itelmar Raydan Evangelista. Publicação: DJEMG- Diário da Justiça Eletrônico TRE/MG, Data 14/4/2020);

AGRAVO INTERNO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2014. Agravo Interno interposto pela AGU contra decisão monocrática que considerou que os juros e correção monetária dos débitos devidos pelo partido à União, devem ser atualizados a partir do trânsito em julgado da decisão que determinou a devolução dos valores ao Tesouro Nacional. Os débitos devidos pelo partido à União, no caso dos autos, referem-se a recursos do fundo partidário recebidos indevidamente pelo partido, em sua prestação de contas anual, referente ao exercício financeiro de 2014, totalizando R$66.000,00.Os débitos relativos a recursos do fundo partidário aplicados de forma irregular devem ser atualizados a partir do trânsito em julgado da decisão que assim reconheceu, uma vez que "a sentença ou acórdão é o marco pelo qual os recursos passam a ser considerados ilícitos. Antes de uma decisão proferida pela Justiça não se pode falar em ilicitude da arrecadação". Decisão com base em precedente deste Tribunal. Mantida a decisão que reconheceu a incidência de juros de mora e correção monetária a partir do trânsito em julgado do acórdão. No caso, o termo inicial para atualização do débito será 15/2/2020, uma vez que o acórdão transitou em julgado em 14/2/2020. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. (TRE-MG - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA nº 000007026, Acórdão, Relator(a) Des. Marcelo Paulo Salgado, Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico-TREMG, Data 11/05/2022). [Original sem grifos].

Com efeito, os juros e correção monetária somente são devidos a partir do trânsito em julgado da decisão que determinou a restituição, haja vista que somente após esse marco é possível falar-se em mora do devedor, não se podendo falar em ocorrência de ato ilícito anteriormente à decisão judicial que ordenou a devolução de valores ao erário.

Ante o exposto, indefiro o pedido formulado pela União e mantenho a decisão desta Presidência de ID 37000781, que determinou que o termo inicial para incidência de juros e correção monetária deve ser a partir do trânsito em julgado do Acórdão que, no presente caso, se dera em 26/6/2021.



Goiânia, na data da assinatura digital.

DES. ITANEY FRANCISCO CAMPOS

Presidente do TRE-GO