Verba Legis 2021

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A IMPORTÂNCIA DA GRATUIDADE JUDICIÁRIA

por Antonio Luiz Vinhal FonsecaNota 01

 

No momento atual, podemos considerar que estamos vivendo no tempo da economia. Podemos fazer esta afirmação vez que as práticas produtivas e econômicas são que nos guiam e conduzem para as satisfações pessoais e/ou materiais. A nossa história de vida e evolução no tempo também segue os passos da economia. Podemos admitir que embora pese a má vontade de alguns, que vivemos em tempos de conflitos, tempo de guerras entre povos, pessoas e nações, o tempo de desconcerto e descontentamento, onde cada pessoa quer ter autonomia e independência de natureza econômica.

A cidadania pode ser considerada como sendo um conjunto de direitos e também de deveres que a pessoa tem com a comunidade em que vive. Esta cidadania ainda não está a disposição de todos, haja visto que ela está associada a fatores de ordem econômicas. Este fato pode ser comprovado quando a lei prevê que as pessoas são legalmente iguais. Mas alguns direitos não são assegurados a pessoas vulneráveis, e vários deveres não são impostos a pessoas de maior poder aquisitivo ou que de alguma forma se escusam de cumprir.

Nesse cenário, o Estado gerencia políticas públicas objetivando reduzir as desigualdade e dificuldade social plena do Brasil. Por tal motivo, a assistência judiciária pode ser considerada como um instituto que garante o acesso à justiça e também uma maneira de fortalecer a cidadania.

 

Princípios Constitucionais da Administração Pública

Preliminarmente é necessário destacar que a Constituição da República Federativa do Brasil de , em seu art. 37, traz os princípios explícitos inerentes à Administração Pública, onde destaca que esta direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência, tornando este em princípios constitucionais da Administração Pública. Não ha que se falar em assistência judiciária sem que sejam observados os princípios basilares e constitucionais da administração pública.

Os mencionados princípios estabelecem as diretrizes fundamentais da Administração, de forma que só poderemos considerar válida a atitude e ação administrativa se estiver consonante com eles. Neste sentido, diante do regramento constitucional desses princípios, e considerando a sua colocação fundamental no início do capítulo constitucional referente à Administração Pública, sendo necessário destacar sua importância bem como a imperatividade que os caracteriza, conforme passamos a discorrer.

O Princípio da Legalidade tem ligação no inciso II do art. 5º da Lei Maior, dispõe que, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Desta forma, pelo que trata o dispositivo elencado no do rol de direitos e garantias fundamentais interpreta-se que a lei, e tão somente ela, em regra, pode criar direitos e obrigações a serem obedecidos pela coletividade.

O conceito de legalidade pode modificar dependendo do sujeito perante o qual é aplicada. Se o sujeito for um particular, a legalidade importa que o mesmo poderá praticar todos os atos que não forem proibidos em lei, se for da administração, deve, em todos os seus atos, ter a lei como fonte, só podendo realizar atos determinados nos termos da lei, ou seja, só podem fazer aquilo que a lei permite ou exige.

Já o Princípio da Impessoalidade, decorre do princípio da igualdade e isonomia. Nenhum aspecto subjetivo deve influenciar na ação da prática do ato, para que este atinja seu objetivo com retidão e de forma legal.

O administrador, e principalmente o administrador público, tem o dever de agir não em seu nome, mas representando o órgão do qual é integrante, do qual recebe poder de mandatário, de forma que os seus comportamentos e atos sejam de responsabilidade do órgão representado em nome do qual atua. De forma resumida, o princípio em comento determina o dever de ser impessoal tanto o agente que atua como o destinatário do ato emanado.

No Princípio da Moralidade, o agente deve atuar por meio de condutas legais, honestas, probas, baseadas em boa-fé, cumprindo os preceitos determinados e estabelecidos na lei, amparando-se em condutas fundadas na ética e retidão funcional, sendo considerados inválidos os atos praticados de forma contrária e diversa, frente e diante da violação à moralidade administrativa que se espera do agente público em toda e qualquer instituição. Ao deixar de observar o princípio em comento não só torna inválido o ato como também faz surgir uma série de punições ao agente público violador, considerando a fundamental importância que possui a moralidade na atuação e no desempenho profissional do agente.

No Princípio da Publicidade estampado na Constituição Federal, por ser um Poder Público, a Administração tem o dever legal de ser o mais transparente possível, para que os destinatários dos atos administrativos possam fiscalizá-los, vez que o poder é exercido em nome do povo e para o povo conforme preceito legal. Assim e desta forma, é inadmissível e reprovável que atos emanados do Poder Público sejam ocultos, obscuros, afastando e inviabilizando seu controle e observação pelos administrados nos moldes determinados pelo ordenamento jurídico pátrio.

Para se tornar legítimo tal princípio, é necessário que as formalidades de torná-lo público tenham sido respeitadas, não sendo requisito para sua completude o conhecimento integral do ato por parte do administrado. No entanto, existem limites de regramento constitucional a esse princípio, vez que em determinadas ocasiões não será necessário e viável a publicidade de tais atos, momentos esses que ocorrerão, em grande parte, quando o agente estiver diante de situações em que seja primordial e necessário o sigilo.

O Princípio da Eficiência teve sua origem com a Emenda Constitucional de número 19, de forma estampada e explicita no texto constitucional. É um princípio não especificamente econômico, vez que também tem seu cunho jurídico, e, segundo o princípio em voga, os atos dos gestores devem atingir e alcançar maiores e melhores resultados com o menos recurso econômico e temporal permitido, havendo uma comparação e relação de custo-benefício onde o benefício deve ser superior quando comparado ao dispêndio.

Fundamenta-se, também, na obrigação que o agente público tem de atingir os resultados legais esperados o tempo todo, desenvolvendo serviços de maior e melhor qualidade atendendo o interesse social que é o destino final da prática administrativa.

Podemos concluir que é necessária a atenção dada aos princípios que embasam o funcionamento do Poder Público, vez que legitimam a prática dos seus atos, evitando-se que sejam maculados de vícios e irregularidades, pois, caso existam tais defeitos, o serviço público não alcançará seu objetivo principal, como consequência a coletividade será prejudicada, pois é a ela que se dirige o foco da atuação pública.

 

Distinções entre Assistência Jurídica, Assistência Judiciária e Justiça Gratuita.

Apesar de os termos justiça gratuita, assistência judiciária e assistência jurídica serem utilizados como se fossem a mesma coisa, não o são. O termo mais utilizado atualmente pela doutrina e pela jurisprudência é o termo justiça gratuita, mas ambos tratam do atendimento às pessoas que necessitarem. Na visão de normas legais vejamos as distinções entre os termos:

a) Justiça gratuita: trata da dispensa das despesas processuais e extraprocessuais, desde que as últimas sejam necessárias para o andamento do processo;

b) Assistência judiciária: engloba o serviço gratuito de representação, em juízo, da parte que requer e tem deferida a citada assistência;

c) Assistência jurídica: esta é ampla e gratuita, pois envolve não somente a assistência judiciária, mas também a consultoria e a orientação jurídica.

 

A Gratuidade da Justiça e as Principais Alterações com o Advento do Novo Código de Processo Civil Brasileiro

Ao fazer a abordagem temática inovadora, verifica-se que a Lei 13.105/2015, teve inicio importante mudança com o Novo Código de Processo Civil, ao estabelecer novas regras para a concessão dos benefícios da justiça gratuita no cenário da legislação processual, tendo por consequência a revogação de alguns dispositivos da lei nº 1.060/50, buscando, desta maneira oferecer maior efetividade e eficiência à questão da gratuidade processual.

Nossas ponderações focam nas medidas implantadas sob a temática da gratuidade da justiça, que objetiva proporcionar efetividade ao contido na Constituição da República Federativa do Brasil, considerada uma constituição cidadão por estabelecer em seu artigo 5º, a assistência jurídica integral.

A Carta Constitucional do Brasil, sofreu enorme influência pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, e em decorrência deste fator, é entendida e tratada como “Constituição Cidadã”. A Constituição envolveu os direitos fundamentais e esses direitos abordam o direito constitucional positivo, com aparência significativa de normas fundamentais ou normas matriz que significam os valores políticos principais do constituinte legislador.

Nesta seara dos direitos fundamentais, podemos ser enfáticos em dizer que o acesso à justiça ou a inafastabilidade do Poder Judiciário existe com determinação constitucional no art, 5º, inciso XXXV, da Carta Magna, quando determina que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito, sendo considerado desta forma, um direito fundamental e deve ser observado.

O acesso à justiça deve possuir interpretação como um acesso justo, com a segurança garantida da imparcialidade que possui como objetivo não só a chance de participação atuante das partes envolvidas no processo mas tenha também alcançar a tutela jurisdicional pretendida considerando a efetividade do direito para atingir o fim almejado, considerando as diferentes posições sociais, bem como as diversidades específicas do direito substancial.

Importa destacar que o direito ao efetivo acesso à justiça tem o reconhecimento de forma escalonada e é um conceito que tem enorme importância entre os novos direitos individuais e sociais. O aceso à justiça não tem caráter de ser um mero direito social fundamental, mas pode ser absorvido e entendido como uma mola central da modernidade processual, onde o estudo deve ser ampliado e aprofundado tendo como meta a obtenção dos objetivos em sua integralidade aos métodos da ciência jurídica moderna.

Destaca-se, no tange à existência de barreiras que dificultam ou impedem um maior e melhor acesso do cidadão ao Poder Judiciário, dentre as dificuldade destacamos a duração do processo, a tutela jurisdicional dos direitos das pessoas, as questões com abordagens psicológicas, culturais e sociais, e ainda o alto custo do processo judicial. O Estado para transpor a problemática financeira como um empecilho do acesso à justiça, estabeleceu no art. 5º, inciso LXXIV, o direito à assistência jurídica na sua integralidade e forma gratuita como maneira de garantir à pessoa carente de recursos, os procedimentos próprios para se chegar e encontrar a proteção jurisdicional.

Nesse direcionamento, é preciso esclarecer que antes de colocar as pessoas necessitadas em situação material de igualdade no processo, é necessário oferecer as condições básicas para ter acesso à justiça sem que exista barreira posterior, oferecendo a gratuidade do acesso ao Poder Judiciário.

Ainda neste diapasão, na grande maioria dos casos, a parte tem que promover as despesas processuais e, exigir este gasto como requisito de acesso à justiça é praticamente o mesmo que proibir e vedar os economicamente desprotegidos do acesso aos seus direitos jurisdicionais, e em consequência deste acontecimento, a Carta Constitucional possibilitou e garantiu a assistência judiciária aos necessitados.

O princípio do amplo acesso à justiça encontra sua base estrutural na justiça gratuita. Esta garantia alem de proteger constitucionalmente, oferece ao requerente, que caso apresente provas que comprove sua dificuldade ou impossibilidade de patrocinar as despesas, ficará dispensado e isento destas.

A derrogação da lei nº 1.060/50

O antigo Código de Processo Civil de , não abordava tratativas do tema justiça gratuita. Antes do código em comento, a disciplina era tratada pela Lei nº 1.060/50, que agora teve grande parte revogada pelo art 1.072, inciso III, do Novo Código. A gratuidade da justiça nos dias atuais, tem seu regulamento estabelecido pelos artigos 98 a 102 do Novo Código de Processo Civil e pelos artigos não revogados da Lei nº 1.060/50.

Ampliações do rol de beneficiários

Com a entrada em vigor do novo ordenamento jurídico, o caput do art. 98, destacou uma ampliação no rol dos sujeitos que podem ser beneficiários pela concessão da assistência judiciária, quando comparado com a regulamentação anterior, previsto no art. 2º da Lei.

Na legislação anterior, só era autorizada a concessão do benefício à pessoa natural, brasileira ou estrangeira que fosse residente no Brasil. Com advento do novo texto legal, não há necessidade ter residência no país, sendo considerado suficiente ser pessoa natural; também alcançou a pessoa jurídica, os benefícios da justiça gratuita, podendo ser beneficiária desde que possa comprovar a insuficiência de recursos para pagar as custas processuais.

Pela interpretação, a análise dos dispositivos supramencionados, podemos observar que a possibilidade de a pessoa jurídica ser beneficiada pela assistência judiciária, não era contemplada, de forma expressa na Lei 1.060/50, no entanto a jurisprudência atual já admitia a possibilidade de concessão de justiça gratuita paras as pessoas jurídicas, desde que provem a necessidade.

Com o dispositivo do art. 98, do Novo Código de Processo Civil, podemos perceber que a condição para o deferimento da gratuidade não está em ser pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, mas sim no fator da insuficiência de recursos para patrocinar o processo judicial. No caso das pessoas jurídicas, as mesmas passam a ser beneficiárias da gratuidade legal, independentemente de obterem finalidade lucrativa.

Gratuidade: presunção ou prova

A pessoas naturais tem acesso garantido por lei ao benefício da gratuidade processual sem a obrigatoriedade de realizar qualquer espécie de prova, nos termos do art. 99, Lei nº 13.105/15.

Apenas é necessário declaração da pessoa física que é carente de recursos para encarar a demanda judicial que tal alegação será bastante para a liberação do benefício, considerando-se que este está acobertado de presunção de veracidade. Tal fato não prejudica que a parte contrária apresente impugnação suficiente a convencer o juiz, a quem cumpre o poder da decisão.

No que diz respeito à pessoa jurídica e aos entes despersonalizados, o legislador deixou permanecer tratamento rigoroso, vez que que terá a obrigação de provar que não é possuidor de recurso capaz de custear despesas processuais, sob pena de ter seu pedido será indeferido.

Do patrocínio ou assistência por advogado particular

Com o surgimento do novo diploma legal, não há vedação para a gratuidade, o fato da assistência por advogado particular. Já a Lei 1.060/50, deixava possibilidade para o indeferimento caso requerente não estivesse representado pela Defensoria Pública ou Procuradoria de Assistência Judiciária.

A justificativa era que se a parte possuía condições de contratar advogado particular, também teria a possibilidade para patrocinar as despesas do processo. O novo aparato jurídico já contempla, com previsão expressa da possibilidade da concessão da gratuidade da justiça ainda que a contratação do advogado tenha natureza particular, independentemente de ser assistido pala Defensoria Pública ou Procuradoria de Assistência Judiciária.

 

Conclusões

Este artigo teve o compromisso e objetivo de compreender a importância para sociedade da Concessão da Gratuidade Judiciária frente às demandas enfrentadas tanto em ações judiciais quanto nas demandas administrativas nos órgãos públicos.

Esta análise foi sustentada num conjunto histórico de legislações que variaram e evoluíram, atendendo aos apelos da sociedade, em especial às pessoas carentes e/ou em situação de vulnerabilidade.

O trabalho envolveu a Lei nº 1.060/50, que estabeleceu normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados passando a regulamentar o atendimento pela Assistência Judiciária pelo Poder Judiciário conforme mencionado na Lei nº 13.105/15, Novo Código de Processo Civil.

Por se tratar de atividade desenvolvida pelo Estado, a assistência judiciária e jurídica se nortearam pelos princípios constitucionais da administração pública quais sejam: Principio da Legalidade, Princípio da Impessoalidade, Princípio da Moralidade, Princípio da Publicidade e Princípio da Eficiência, que em suma ficou demonstrado que o particular pode fazer tudo que não for proibido em lei, já para a Administração Pública, só pode realizar as atividades previstas em lei.

Destacou-se neste tema, as diferenças entre assistência judiciária e assistência jurídica. A primeira engloba o serviço gratuito de representação em juízo, da parte que requer e tem deferida a citada assistência. A segunda, é mais abrangente pois envolve não somente a assistência judiciária, mas também a consultoria e orientação jurídica.

Observou-se que a gratuidade da assistência judiciária, a assistência jurídica em várias das suas extensões correspondente ao que determina o atrigo 4º, da Lei Federal 1.060/50, de que é necessário apenas a mera afirmação da parte requerente para que lhe seja outorgado tais benefícios.

De forma inovadora, abordou-se as principais alterações com o advento do Novo Código de Processo Civil Brasileiro, lei nº 13.105/2015, no que tange à gratuidade da justiça, onde destacou-se a derrogação parcial da Lei nº 1.060/50, a ampliação do rol de beneficiários da justiça gratuita, a inclusão de pessoas físicas e jurídicas, brasileiras ou estrangeiras, a relação de despesas que integram a gratuidade, o parcelamento das despesas, o tipo de pedido e o momento processual para pedir, o patrocínio por advogado particular, a impugnação da concessão do benefício, a sucumbência do benefício e as multas processuais, tudo regulamentado pelo legislador pátrio e em consonância com a Constituição Federal.

Os direitos sociais na Constituição da República Federativa do Brasil, são considerados matéria de cunho constitucional vez que a Carta Magna de , dedicou um capítulo específico para tratar destes direitos os quais possuem ligações diretas com as pessoas carentes, destinatárias da assistência jurídica integral e gratuita que envolve o princípio constitucional da dignidade humana.

Nota 01 Servidor do Tribunal Regional Eleitoral de Goiás, Mestre em Mediação e Resolução de Conflitos.