Verba Legis 2021

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A efetividade do habeas corpus no Direito Eleitoral

por Dirceu Lopes da CostaNota 01

 

Resumo

O artigo ora apresentado tem por intento falar das hipóteses de admissibilidade do habeas corpus e sua competência na justiça eleitoral. Abordará também a origem desse writ datado do direito romano com o fulcro de tutelar a liberdade de locomoção do indivíduo, não podendo ser suprimido, já que é uma cláusula pétrea e se refere a uma ação sumaríssima e constitucional de caráter penal da qual exige prova pré-constituída e não se utiliza para o reexame de fato controvertido ou que demande dilação probatória. Falará da garantia constitucional de seu objeto (da Liberdade, isto é, não se restringindo apenas à de locomoção). Igualmente, do cabimento deste writ junto a esta respectiva justiça democrática.

PALAVRAS-CHAVE: habeas corpus. Constituição Federal. Soberania Popular. Liberdade.

 

1. Introdução

Este artigo buscar-se-á estudar a garantia constitucional do habeas corpus junto à justiça eleitoral. Sim, uma ação constitucional de caráter penal reverberando nessa justiça especializada de competência privativa da União.

Falar-se-á especificamente sobre o primeiro remédio constitucional conhecido, o writ do habeas corpus, que tem por função tutelar a liberdade de locomoção do ser humano contra ato ilegal ou abuso do poder estatal ou particular. Por se tratar de um direito de primeira dimensão ou direitos negativos (obrigação de não fazer) ou individuais.

Nesse sentido, mostrar-se-á o contexto histórico do writ com suas evoluções ao longo da história, especificamente no momento republicano atual; igualmente, sobre a sua garantia constitucional voltada à defesa do ser humano, da sua admissibilidade e competência.

É sabido que o impetrante é qualquer pessoa humana, seja física ou jurídica (nacional ou estrangeira), pessoa capaz ou incapaz, em benefício próprio ou de terceiros. Ressalta-se que a pessoa jurídica não figura como paciente; já em relação à autoridade coatora (pessoa responsável pela coação ilegal) esta pode vir a ser autoridade pública ou particular. E não há necessidade de advogado para impetrá-lo.

Sendo assim, este artigo versará sobre o habeas corpus (writ), um dos remédios constitucionais mais relevantes do Estado Democrático de Direito e sinônimo de Constituição Republicana, com atuação direta no direito eleitoral. Já que a sociedade é mutável, quer seja, está em constante evolução, por isso a Carta-Mor necessita de oxigênio constante para levar ao jurisdicionado um melhor desempenho jurídico.

Nesse sentido, passa-se a analisar o objeto deste trabalho.

 

2. A Origem do Habeas Corpus

Ao falar da origem do habeas corpus, torna-se necessário, antes, enunciar o significado desse remédio constitucional de caráter penal, conforme preleciona TemerNota 02 (8): “Toma (literalmente: tome no subjuntivo, habeas, de habeo, habere, ter, exibir, tomar, trazer, etc.) o corpo deste detido e vem submeter ao Tribunal o homem e o caso”.

Dessa forma, o significado completo é “Habeas Corpus ad subjiciendum” do latim que significa ‘tenhas o teu corpo para submetê-lo (à Corte de Justiça)’, expõe a pessoa que está sofrendo ilegalidade/constrangimento em sua liberdade de locomoção. Liberdade essa, que nos dizeres de Martin Luther King, jamais é dada pelo opressor e sim tem que ser conquistada pelo oprimido.

Entende-se por habeas corpus, uma garantia individual ao direito de locomoção do ser humano; pode ser entendido, também, como direito líquido e certo ou por uma ordem judicial a fim de cessar a coação do coator. Quer seja, é uma garantia processual de liberdade que existe há vários séculos, conforme analisado acima.

Na época do direito romano, o habeas corpus era usado como medida de proteção para todo cidadão, por meio do interdictum de libero homine exhibendo; já muitos doutrinadores entendem que esse remédio heroico, de natureza garantista, teve sua origem datada em , no direito inglês, a partir da primeira constituição histórica, a Carta do Rei João Sem Terra, imposta pelos barões.

Observa-se a ideia do insigne Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de MoraesNota 03, em relação à Magna Carta de :

[...] a Magna Carta, em seu capítulo XXIX, onde, por pressão dos barões, foi outorgada pelo Rei João Sem Terra em , nos campos de Runnymed, na Inglaterra. Por fim, outros autores apontam a origem do habeas corpus no reinado de Carlos II, sendo editada a Petition of Rights, que culmimou com o habeas corpus Act de . Mas a configuração plena do habeas corpus não havia, ainda, terminado, pois até então somente era utilizado quando se tratasse de pessoa acusada de crime , não sendo utilizável em outras hipóteses. Em , o novo habeas corpus Act inglês ampliou o campo de atuação e incidência do instituto, para colher a defesa rápida e eficaz da liberdade individual.

Registra-se que Magna Carta de foi outorgada por pressão dos barões, nobres, do clero e não para o povo em geral. Entretanto, foi somente em que o campo de atuação da liberdade individual do ser humano foi ampliado, já que as arbitrariedades levaram o povo inglês a clamar por efetivas garantias pessoais.

Ao editar o habeas corpus Amendment Act, , foi estabelecido o regramento procedimental do remédio jurídico, configurado como um remédio a assegurar a liberdade dos súditos e prevenir os encarceramentos em ultramar. Essa lei significou um grande passo para a liberdade, chegando a ser chamada de “Segunda Magna Carta”.

Essa garantia de liberdade para o ser humano ganhou mais visibilidade com o habeas corpus Act, em que veio corrigir falhas da Carta Magna de , passando a proteger a pessoa presa ou detida por motivos diversos da acusação criminal e de que as pessoas livres só fossem julgadas por seus pares, segundo as leis do país; a partir desse momento, a Law of the Land (origem remota do devido processo legal) se originou para lutar pela liberdade da época.

O writ encontrou guarita nas Treze Colônias Norte-Americanas, herdeiras da tradição jurídica inglesa, ante as opressões exercidas pelo reino à tutela de suas liberdades individuais. Para ratificar o fato, a Carta Constituinte Norte-Americana de em sua seção IX, previu a garantia desse writ, com a seguinte redação: “O privilégio do direito do habeas corpus não deve ser suspenso, a não ser em casos de rebelião ou invasão da segurança pública que podem assim requerer”Nota 04.

Frisa-se que por meio da Constituinte de , o Due Process of Law (origem mais próxima do devido processo legal) que significa justo processo jurídico foi encetado para defender as liberdades, em especial a de locomoção.

 

3. O Histórico do Habeas Corpus no Brasil em Face das Constituições.

Noutro sentir, após a redemocratização ocorrida em , houve a necessidade de uma nova Constituinte, que veio apenas em , em 05 de outubro, em que estabeleceu um novo marco de liberdade. O habeas corpus, como remédio constitucional, foi inserido no artigo 5º, LXVIII, com a seguinte redação: “Conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”.

O habeas corpus como garantia constitucional está ligada a outra garantia a da liberdade de locomoção, logo a Carta-Mor dispõe em seu artigo 5º, XV o seguinte teor: “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”.

Hoje, habeas corpus é uma garantia processual, cabível a todos os seres humanos que venham sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção; apesar disso, existem vedações a este remédio heroico, quando se refere às transgressões disciplinares, no Código de Processo Penal Militar (CPPM). Mas ressalta-se que não há vedação ao judiciário nos aspectos relativos à legalidade do ato punitivo, excluindo a apreciação de questões referentes ao mérito.

Nesse segmento, é importante observar a redação da Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH), promulgada em , em seu artigo 8º, “Todo ser humano tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei”. E também ao artigo 13 dessa Carta, que permeia à liberdade de locomoção de todo e qualquer ser humano.

Entende-se por remédio efetivo, os remédios constitucionais (sem especificá-los). Assim, o habeas corpus como remédio constitucional, é uma garantia concedida às pessoas e trata-se de ação autônoma de impugnação, voltada à proteção da liberdade de locomoção.

O writ visa prevenir qualquer restrição ilegal ou abusiva à liberdade de locomoção e é um meio de impugnação de quaisquer atos administrativos, judiciais e de particulares, quer seja, é uma ação constitucional para tutelar o jus libertatis do paciente/agente.

Outrossim, frisa-se que o termo justiça para a DUDH é conceito holístico que inclui também prover remédios efetivos para a injustiça e violações dos direitos de todos os indivíduos, como garantido pela Carta Cidadã ou pela Lei.

 

4. Do Habeas Corpus como Garantia Processual do ser humano

Antes de enunciar sobre esta garantia processual, concerne-se que é uma espécie de remédio constitucional que, segundo o Egrégio constitucionalista José Afonso da Silva (), são “garantias constitucionais na medida em que são instrumentos destinados a assegurar o gozo de direitos violados ou em vias de ser violados ou simplesmente não atendidos”.

Sabe-se que a Carta-Mor de garante a liberdade de forma irrestrita; entre estas liberdades, tem-se a liberdade de locomoção e, não menos importante, têm-se a liberdade de expressão, de manifestação de pensamento, a de reunião, a de consciência e de crença, mas com limitações ao expressá-las.

Com a tutela do direito à liberdade expressa na Constituinte é plausível que vez ou outra, venha existir violação a esse direito à liberdade como, por exemplo, no caso da restrição da liberdade de locomoção perpetrada pelo Estado sem o devido processo legal ou fora da lei.

Nesse consentâneo, a Carta Maior previu a ordem do habeas corpusNota 05 como um meio para sanar a limitação ou a ameaça à liberdade. Assim, esse mandamus é admissível para movimentar o Poder Judiciário, com o cerne de cumprir uma garantia essencial previsto na Carta Cidadã.

Frisa-se que o habeas corpus visa proteger a emancipação do ser humano diante do abuso do Estado, por isso é uma garantia irredutível que não pode ser modificada, em prol da liberdade do homem. Pois, como dizia Machado de Assis “A liberdade não morre onde restar uma folha de papel para decretá-la.”

À vista disso, o objeto do habeas corpus é a “proteção da liberdade de locomoção” contra ilegalidade ou abuso de poder, com o intuito de assegurar o direito de ir e vir, sendo excluídos de sua proteção os direitos públicos subjetivos amparados por outros remédios constitucionais, conforme doutrina de Alencar e TávoraNota 06.

Menciona-se que o objeto imediato do pedido de habeas corpus é a tutela jurisdicional da liberdade de ir e vir; já o objeto mediato do writ é a liberdade corpórea do indivíduo, seu direito de locomoção, posto em perigo.

A propósito, exige-se prova pré-constituída e seu pedido é autônomo e originário. E esta feição acompanha o referido instituto desde o seu nascedouro, logoNota 07:

[...] o pedido de habeas corpus é pedido de natureza de prestação jurisdicional em ação (...). A ação é preponderantemente mandamental. Nasceu assim o instituto. Os dados históricos no-lo provarão. Não se diga (a erronia seria imperdoável) que se trata de recurso. A pretensão não é recursal. Nem no foi, nem no é. É ação contra quem viola ou ameaça violar a liberdade de ir, vir e ficar.

Quanto à competência, menciona-se que os juízes a quo e os tribunais ad quem as têm para expedir de ofício o habeas corpus, quando constatado no curso do processo que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal, colocando em risco a liberdade de locomoção.

Noutro giro, frisa-se que o writ pode se apresentar como preventivo, isto é, quando alguém se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, no qual expedirá um salvo-conduto em prol do paciente; liberatório ou repressivo, cabível quando a violência ou restrição ao direito de liberdade do paciente restar consumada; por fim, o trancativo, com o fito de requerer o término da ação penal ou arquivamento do inquérito policial, em razão de ausência de justa causa ou diante de ilegalidade inequívocaNota 08, conforme expõe Barros e Paes.

 

5. Do Cabimento do Habeas Corpus

O cabimento da ação de habeas corpus está tipificada no artigo 648 do CPP e, além do mais, acontece quando há violência ou coação em virtude de constrangimento ilegal e ilegalidade ou abuso de poder cometido pelo poder estatal, diante da liberdade de locomoção.

O termo violência (vis corporalis) acarreta agressão física. Para que o legitimado ativo não tenha liberdade corpórea, evidencia-se um constrangimento físico à liberdade de locomoção; já no tocante à coação acarreta agressão moral (vis compulsiva), que pode decorrer de ameaça ou intimidação.

Quanto à ilegalidade ou abuso de poder, o magistério de Lima () vem nos ensinar que “o habeas corpus somente será cabível quando restar evidenciado constrangimento ilegal à liberdade de locomoção”.

Observa-se que o abuso de poder configurado pela autoridade coatora ocorre quando a autoridade realiza condutas inadequadas, com finalidade diversa da lei ou quando a autoridade, conquanto competente para o ato, ultrapassar os limites que lhe eram permitidos por lei.

Esse abuso é o exercício irregular do poder, caracterizado pela incompetência do agente para a prática do ato ou em nome da lei, contudo, por ela não autorizada.

 

6. Da Competência do Writ

A respeito da competência do habeas corpus ou quanto ao Órgão competente, à apreciação será determinada em face do impetrado e se orientará por critérios de territorialidade, de hierarquia e prerrogativas de foro.

Já ao critério territorial, o Juiz a quo se limita ao território da comarca ou circunscrição judiciária de sua atuação; já em relação aos Tribunais ad quem, a atuação se limita ao território do respectivo Estado ou do Distrito Federal e Territórios. Por sua vez, os órgãos máximos de Jurisdição (Tribunais Superiores, incluindo o STF), têm competência em todo território nacional.

Quanto ao critério de prerrogativa de foro, releva-se a competência originária para julgamento de habeas corpus, quer seja, quando o impetrante ou autoridade coatora tiver foro privativo pela prática do crime. Já em relação à hierarquia, a competência para o processamento do remédio ora analisado, será por meio do ato constritivo de autoridade judiciária, conforme previsto no artigo 650,§ 1º do CPP: “A competência do juiz cessará sempre que a violência ou coação provier de autoridade judiciária de igual ou superior jurisdição”.

Urge enunciar que a Carta Cidadã, por conseguinte, como as Constituições de cada Estado, da Lei Orgânica do Distrito Federal (DF) e dos regimentos internos dos Tribunais ad quem preveem situações à competência dos Tribunais Superiores, a serem estudados.

Observa-se que os órgãos de jurisdição têm competência para o julgamento do writ, que se define em conformidade com a qualidade da pessoa responsável pela ilegalidade ou pelo impetrante que sofre lesão ou ameaça de lesão à liberdade de locomoção.

No tocante à justiça eleitoral, diz-se que cabe a essa Justiça Democrática julgar o habeas corpus em matéria de sua competência, nos casos do artigo 121, §§ 3º e 4º, V da Carta Cidadã, com a seguinte redação:

“artigo 121: Lei Complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais. (...) §3º: são irrecorríveis as decisões do Tribunal Superior Eleitoral, salvo as que contrariarem esta Constituição e as denegatórias de habeas corpus ou Mandado de Segurança. §4º: “Das decisões dos tribunais Regionais Eleitorais somente caberá recurso quando: (...) V- denegarem habeas corpus, mandado de segurança, habeas data ou mandado de injunção”. (Grifo nosso)

Igualmente, menciona-se que o novel Código Eleitoral preceitua a competência dessa justiça especializada, para julgar e conhecer o writ em todos os graus de jurisdição seja Juízes Eleitorais, vide artigo 35, III; Tribunais Regionais Eleitorais, vide artigo 29, “e”; Tribunal Superior Eleitoral (TSE), vide artigo 22, I, “e”.

Salutar trazer à baila uma das hipóteses de cabimento do habeas corpus, conforme Acórdão datado em no RHC nº 7228, da rel. Min. Luciana Lóssio, com a seguinte redação:

“Recurso Em habeas corpus. Ação Penal. Arts. 299 Do Código Eleitoral. Ação De Investigação Judicial Eleitoral. Art. 41-A Da Lei Nº 9.504/97. Independência Das Instâncias. Trancamento. Falta De Justa Causa. Não Ocorrência [...] 2. Na linha da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral e do Supremo Tribunal Federal, o trancamento da ação penal por meio do habeas corpus só é admitida em hipóteses excepcionais, quando patente a atipicidade da conduta,ausentes indícios mínimos de autoria ou presente causa extintiva da punibilidade, o que não se vislumbra no presente caso [...]”. (Grifo nosso).

Nesse diapasão, somente por exceções que se admitem o trancamento da ação penal via writ, tal como somente é admissível quando constatada a ilegalidade capaz de restringir a justa causa para o andamento do feito, por exemplo, na atipicidade da conduta descrita na denúncia, na ausência de indícios de autoria e na materialidade delitiva, ou quando presente causa extintiva da punibilidade, conforme acórdão de 07.06.2016 no RHC nº 18057, da relatoria (rel.) Min. Luciana Lóssio.

Registra-se que a concessão de habeas corpus ex officio demanda a verificação (de plano) por parte exclusiva do magistrado, de iminente ocorrência de coação ilegal e incontroversa, nos ditames do artigo 654, § 2º, do CPP, em conformidade com o AgR-AI nº 74668, da rel. Min. João Otávio de Noronha, datado de 17.03.2015.

Importante trazer o entendimento de que em eventual coação ilegal, a parte deverá ser arguida na Egrégia Corte Constitucional (STF) a quem compete julgar habeas corpus contra ato coator do TSE, nos termos do art. 102, I, i, da Carta-Mor, conforme decidiu o Ministro Edson Fachin, no HC nº 0600465-87.2019.6.00.0000/RN.

Traz a lume que os delitos eleitorais são processados via ação pública incondicionada, vide o artigo 355 do Código Eleitoral, incluindo aqueles contra a honra (objetiva e/ou subjetiva), pois nesses também se coíbe a propaganda eleitoral ilícita.

Enuncia-se, igualmente, que os crimes comuns conexos aos delitos eleitorais, são: delitos contra as finanças públicas, direitos e valores, corrupção ativa e passiva, crimes contra o sistema financeiro nacional, lavagem de dinheiro e/ou ocultação de bens, crimes praticados por organizações criminosas e os de associação criminosa, de constituição de milícia privada, com processamento das ações penais e investigações. Tais delitos estão elencados na decisão da Egrégia Corte Constitucional (STF), conforme Inquérito 4435/DF.

É lapidar arrazoar que esse remédio constitucional somente é admissível nessa seara do direito, uma vez que a justiça eleitoral (democrática) substituiu o Poder Legislativo na função de assegurar o preceito representativo e democrático, conforme previa o artigo 21 da Constituição do Império, 1824, e o artigo 18, parágrafo único da primeira Constituinte da República, 1891.

Arremata-se por fim que a matéria, habeas corpus, é relevante para este Egrégio Regional Eleitoral (TRE-GO), conforme estatui o seu Regimento Interno (Resolução nº 298/2018) nos artigos 70 a 79. Destaca-se de exemplo o artigo 75, por sua importância quanto ao objeto do writ, vejamos: “Art. 75. O Tribunal poderá, de ofício, expedir ordem de habeas corpus quando, no curso de qualquer processo, verificar que alguém está sofrendo ou na iminência de sofrer coação ilegal ou abusiva”.

Nessa senda, urge trazer o pensamento do Eminente Ministro Edson Fachin, do STF, senão vejamos:

“A justiça eleitoral não se trata, portanto, de apenas mais um Órgão que compõe o Judiciário Brasileiro, mas é a Instituição que tem como mandamento constitucional.”

Sendo assim, seria impensável imaginar que o principal remédio constitucional, habeas corpus, deixasse de fazer parte dessa Instituição democrática.

 

7. Conclusão

Ao fim dessa construção teórica e pelo exposto acima, constatou-se que o habeas corpus é uma garantia processual de natureza constitucional de caráter penal, por excelência.

Igualmente, sua origem pretérita é datada do direito romano por meio da ação interdictum de libero homine exhibendo e mais tarde ressurgiu na Inglaterra com a Carta Magna de , no entanto, restrita aos barões e nobres. Foi somente em , por meio do habeas corpus Amendment act, que o writ abarcou as garantias pessoais e aperfeiçoadas em .

Em relação ao Brasil, a análise desse estudo se originou por meio da atual Carta Cidadã de .

Nesse sentido, interpretou-se que o habeas corpus está umbilicalmente ligado às constituições promulgadas (quanto à origem) e rígidas (quanto à estabilidade). Inclusive, esse mandamus é próprio de um Governo Republicano e de um Estado Federado centrífugo/desagregação, tal qual é a República Federativa do Brasil ou por agregação (dos Estados Unidos da América).

Observou-se que o habeas corpus protege a independência de locomoção, o direito de ir e vir do ser humano em face da violência, coação e abuso de poder da autoridade coatora, sendo, portanto, uma garantia fundamental e o direito à liberdade, direito esse intrínseco ao ser humano e indissociável às regras do jogo democrático. Já dizia a escritora Cecília Meireles: “Liberdade, palavra que o sonho humano alimenta que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda”.

Foi visto as hipóteses de cabimento do habeas corpus, assim como a competência na seara da justiça eleitoral. Ou seja, esse remédio constitucional é um direito fundamental e se pressupõe como um padrão de legitimação democrática.

Conforme enunciava Pontes de Miranda, “Onde não há remédio do rito do habeas corpus, não há, não pode haver garantia segura da liberdade física. Errar é humano, coagir é vulgar, abusar do poder é universal e irremediável. A contemporaneidade confirma-o a cada passo”.

 

Referências

Nota 01 O autor é Pós-Graduado Lato Sensu em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Estado de Goiás (PUC/GO); Graduado em Ciências Jurídicas pela Universidade Potiguar do Rio Grande do Norte (UNP/RN) e advogado inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil. E-mail: dirceulopesadv@hotmail.com

Nota 02 (TEMER, , p.202)

Nota 03 (MORAES, , p. 118)

Nota 04 No original, “The privilege of the writ of habeas corpus shall not be suspended, unless when in Cases of Rebellion or Invasion the public Safety may require it”.

Nota 05 O Habeas Corpus é uma ordem judicial emitida por um tribunal para uma pessoa que tomou outra sob custódia, sob a lei, ordenando que aquela apareça perante o tribunal e justifique a base legal para essa custódia. Se ela não puder fazê-lo, o tribunal ordenará a libertação da pessoa detida ilegalmente. Trecho da Proclamação suspendendo o mandado de habeas corpus, 24/09/1862, por Abraham Lincoln.

Nota 06 (ALENCAR; TÁVORA, , p. 896).

Nota 07 Miranda 1990 (apud FOPPEL; SANTANA. In DIDIER JUNIOR, Fredie (Org.), , p.38).

Nota 08 https://2019.vlex.com/#vid/habeas-corpus-no-direito-694732545