Verba Legis 2023

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A propaganda eleitoral nas dependências do Poder Legislativo

por Daniel Boaventura França Nota 01

 

 Introdução

A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988) Nota 02 preceitua que o Poder Legislativo é um dos poderes independentes que compõem a União e convivem harmonicamente entre si Nota 03. Esta sistemática evidencia que nossa Carta Magna adotou a Teoria da Separação dos Poderes, cuja divisão funcional não confere poder absoluto a nenhum dos três poderes, funcionando os mecanismos de “freios e contrapesos” como forma de balancear e harmonizar o exercício das competências constitucionais.

No âmbito do Direito Eleitoral o Poder Judiciário atua com certa primazia, na medida em que faz o papel típico do exercício da jurisdição, mas também tem duas atribuições atípicas: expede normas regulamentares para a execução dos certames (art. 1º, parágrafo único c/c art. 23, IX, ambos do Código Eleitoral Nota 04 Nota 05) (BRASIL, 1965) e administra toda a logística para a realização das eleições.

Abrindo um parêntese, impende esclarecer que essa competência alargada da Justiça Eleitoral tem razões históricas: as experiências negativas das eleições realizadas tão somente para legitimar uma aparente democracia. Foi nesse contexto que a Justiça Eleitoral foi idealizada e criada em 1932, visando combater eleições em que o eleitor não manifestava livremente sua escolha política, seja por coação, seja por fraudes em geral.

Na tentativa de contrabalancear o nítido comando do Poder Judiciário Eleitoral sobre o prélio e de observar a independência do Poder Legislativo, a legislação ressalvou, em alguns pontos, que o Poder Legislativo atuaria com maior liberdade em conformidade com suas atribuições constitucionais e legais.

E é acerca de uma dessas ressalvas que se detém este artigo, citando e comentando rapidamente suas nuances, sem o intento de esgotar a matéria que envolva o ponto abordado na seara do Direito Eleitoral.

Ainda no introito, esclareça-se que o presente trabalho abordou especificamente as propagandas eleitorais, sem se imiscuir na análise das publicidades institucionais que envolvam o exercício das funções típicas do Poder Legislativo.

 

1. A propaganda eleitoral nas dependências do Poder Legislativo

A propaganda eleitoral está intrinsecamente ligada ao princípio democrático, na medida em que permite o debate de pensamentos e possibilita ao eleitor conhecer e decidir por uma posição política.

Contudo, apesar da liberdade de propaganda eleitoral ser um princípio jurídico de matéria eleitoral, o direito de propaganda não é absoluto e encontra variadas limitações na legislação de regência, entre elas a vedação de veiculação de propaganda de qualquer natureza, em bens cujo uso dependa de cessão ou permissão do poder público, ou que a ele pertençam, e nos bens de uso comum.

Nessa vedação se incluiria, em tese, os prédios que abrigam as Casas Legislativas, contudo os mesmos foram excluídos da proibição imposta. A Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97 Nota 06) (BRASIL, 1997) delegou à Mesa Diretora de cada Parlamento decidir sobre a veiculação de propaganda nas dependências do Poder Legislativo, por meio do § 3º do artigo 37 do aludido diploma, nos seguintes termos:

Art. 37. Nos bens cujo uso dependa de cessão ou permissão do poder público, ou que a ele pertençam, e nos bens de uso comum, inclusive postes de iluminação pública, sinalização de tráfego, viadutos, passarelas, pontes, paradas de ônibus e outros equipamentos urbanos, é vedada a veiculação de propaganda de qualquer natureza, inclusive pichação, inscrição a tinta e exposição de placas, estandartes, faixas, cavaletes, bonecos e assemelhados.

 

 § 3º Nas dependências do Poder Legislativo, a veiculação de propaganda eleitoral fica a critério da Mesa Diretora.

Note-se que, a princípio, para haver a exclusão do impedimento de propaganda nos prédios do Legislativo, deve haver uma norma interna que permita a publicidade, haja vista que o caput acima transcrito proíbe a propaganda em bens públicos e, na ausência de ato interno, prevaleceria as normas gerais estabelecidas. O Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco tem precedente com esse mesmo entendimento:

REPRESENTAÇÃO POR CONDUTA VEDADA. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. ADOÇÃO DO RITO DO ARTIGO 22 DA LC 64/90. ILEGITIMIDADE DA COLIGAÇÃO MAJORITÁRIA. ILEGITIMIDADE DE BENEFICIADO DA PROPAGANDA ELEITORAL. AUSÊNCIA DE PRÉVIO CONHECIMENTO. LEGITIMIDADE DO BENEFICIADO PARA FIGURAR NO POLO PASSIVO DE AÇÃO DE CONDUTA VEDADA. PROPAGANDA IRREGULAR NO PODER LEGISLATIVO. DEPENDÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO DA MESA DIRETORA. CONDUTA VEDADA. NÃO CONFIGURAÇÃO.

 

1. Possibilidade de cumulação de pedidos de reconhecimento de incidência propaganda eleitoral irregular em bens públicos com condenação por prática de conduta vedada descrita no artigo 73, inciso I, da Lei n.º 9.504/97, haja vista a adoção do procedimento mais elástico, previsto no artigo 73, inciso I, da Lei n.º 9.504/97.

 

2. Ilegitimidade da coligação majoritária para figurar como litisconsorte passivo necessário nas ações eleitorais, ajuizadas para averiguar a responsabilidade em ilícitos eleitorais, supostamente praticados para beneficiar candidato a deputado estadual. O artigo 6º da Lei n.º 9.504/97 faculta a realização de coligação apenas para atuar em eleições majoritárias.

 

3. Ilegitimidade do candidato a deputado estadual supostamente beneficiado pela prática de propaganda irregular na Câmara de Vereadores, em razão da impossibilidade de presunção de seu prévio conhecimento, conforme exige o artigo 40B da Lei n.º 9.504/97. Legitimidade do mesmo candidato para figurar no polo passivo de conduta vedada, prevista no artigo 73, inciso I, do CPC, haja vista que o §4º do artigo 73 da Lei n.º 9.504/97 determina que as sanções são impostas àqueles que delas se beneficiam.

 

4. Diante da ausência de autorização da Mesa Diretora para regulamentar a propaganda eleitoral dentro da Câmara Municipal, tem–se aplicável à espécie a regra geral prevista no caput do acima transcrito art. 37 da Lei nº 9.504/1997, a qual proíbe a veiculação de propaganda eleitoral em bens públicos, uma vez que só é excetuada justamente pela regulamentação. Multa aplicada em seu mínimo legal.

 

 5. A aposição dos adesivos na porta de entrada do gabinete do segundo Representado, localizado no interior do prédio do Legislativo Local, não configura conduta vedada, prevista no artigo 73, inciso I, da Lei n.º 9.504/97, na medida em que não se utilizou bens da Câmara de Vereadores de Garanhuns na correlata campanha eleitoral, mas apenas se fixou adesivos na porta de entrada do mencionado gabinete, o que claramente constitui apenas propaganda irregular.

 

6. Procedência parcial dos pedidos arrolados na petição inicial para condenar o vereador ao pagamento de multa por prática de propaganda eleitoral em bens públicos em seu patamar mínimo.

 

(TRE-PE, REPRESENTAÇÃO nº 060194002 Nota 07, Acórdão, Relator(a) Des. DARIO RODRIGUES LEITE DE OLIVEIRA, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 26/10/2022)

Entretanto, nos parece um tanto irrazoável a proibição total de propaganda eleitoral dentro de uma Casa Legislativa e de difícil fiscalização, podendo, até mesmo, ensejar socorro do Poder Judiciário por excesso de restrição. Poder-se-ia argumentar no sentido de que a proibição total já está contida no caput do aludido artigo 37, porém a melhor exegese a extrair desse dispositivo é que deve haver equilíbrio na sua incidência. Nesse sentido foi a compreensão do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia:

Mérito. O simples fato de encontrar-se material de publicidade nas dependências da Assembléia Legislativa, não autoriza a conclusão de que o Representado tenha incorrido na prática das condutas proscritas pela legislação de regência, máxime em se considerando a possibilidade de divulgação, no interior da referida Casa, de propaganda eleitoral de candidatos, tal como faculta o § 3° do art. 37 da Lei n° 9.504/97, pelo que, aplicando-se o princípio da proporcionalidade, julga-se improcedente a pretensão.

 

(TRE-PE, REPRESENTAÇÃO e RECLAMAÇÃO (RE9504) nº 565 Nota 08, Acórdão de 24/11/2005, Relator(a) Des. PEDRO DE AZEVEDO SOUZA FILHO) (grifei).

Diz-se que o Poder Legislativo tem, na hipótese, direito à liberdade regrada na normatização em tela, considerando que deve respeitar os limites da legislação de regência e critérios de isonomia entre os candidatos. Nesse mesmo passo são as lições do doutrinador Rodrigo Lopes Zilio:

Nesse contexto, é reconhecida uma liberdade regrada para a Mesa Diretora deliberar sobre a veiculação de propaganda nas dependências do Poder Legislativo. In casu, chama-se liberdade regrada porque, nada obstante sua autonomia, na regulamentação do âmbito interno a Mesa Diretora deve observar critérios de razoabilidade na distribuição de espaços locais de equivalente impacto visual na proporção das agremiações participantes do pleito.

 (ZILIO, 2022, p.456) Nota 09

Contudo, adotando posição de maior liberdade ao Legislativo, o Tribunal Regional Eleitoral do Paraná referendou norma bastante rígida da Câmara Municipal de Ponta Grossa. Eis a ementa do julgado:

RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. USO DE MÁSCARA FACIAL CONTENDO SLOGAN DE CANDIDATURA E NÚMERO DE CAMPANHA POR VEREADOR NA SESSÃO LEGISLATIVA DA CÂMARA MUNICIPAL. CONDUTA VEDADA A AGENTE PÚBLICO. ART. 73, I DA LEI Nº 9.504/1997. USO DE BEM PÚBLICO. LEGITIMIDADE PASSIVA DOS BENEFICIÁRIOS RECONHECIDA. NÃO CARACTERIZAÇÃO DA CONDUTA VEDADA. MULTA AFASTADA. PROPAGANDA IRREGULAR. ART. 37, § 3º DA LEI Nº 9.504/1997. PROIBIÇÃO POR ATO DA MESA DIRETORA DA CÂMARA MUNICIPAL. CARACTERIZAÇÃO DA PROPAGANDA IRREGULAR. AUSÊNCIA DA PRÉVIA INTERPELAÇÃO EXIGIDA PELO ART. 37, § 1º DA LEI DAS ELEIÇÕES. INAPLICABILIDADE DE SANÇÃO. RECURSO DOS REPRESENTANTES CONHECIDO E PROVIDO. RECURSO DO REPRESENTADO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

 

1. De acordo com o art. 73, § 8º da Lei das Eleições, os partidos políticos, coligações e candidatos beneficiários são partes legítimas para figurar no polo passivo de Representação por conduta vedada, ainda que sua responsabilização reclame a comprovação do prévio conhecimento (TSE, AI 34041, Rel. Min. Og Fernandes, DJ 15.06.2020), matéria reservada ao mérito.

 

2. O uso de máscara facial contendo slogan de candidatura e número de campanha, por vereador, durante a sessão legislativa da Câmara de Vereadores, não configura a conduta vedada do art. 73, I da Lei 9.504/1997.

 

 3. Nos termos do art. 37, § 3º da Lei nº 9.504/1997, a veiculação de propaganda eleitoral nas dependências do Poder Legislativo fica a critério da Mesa Diretora.

 

 4. Diante da previsão expressa de Portaria da Mesa Diretora da Câmara Municipal no sentido de que é vedada a utilização de camisetas, bonés, broches, dísticos, faixas e qualquer outra peça de vestuário que contenha alusão, ainda que indireta, de caráter eleitoral nas dependências internas da Câmara Municipal, o uso de máscara facial contendo slogan de candidatura e número de campanha por vereador, durante a sessão da câmara, caracteriza propaganda irregular.

 

 5. A aplicação de sanção pela veiculação de propaganda irregular em bens públicos reclama a demonstração de que o responsável foi interpelado para removê-la, nos termos do art. 37, § 1º da Lei das Eleições.

 

 6. Recurso dos representantes conhecido e provido para reconhecer a legitimidade passiva do candidato e partido beneficiados. Recurso do representado conhecido e provido para afastar a configuração de conduta vedada e, de conseguinte, a multa aplicada.

 

 (TRE-PR, Representação nº 06001314320206160139 Nota 10, Relator(a) Des. Roberto Ribas Tavarnaro, Publicação: DJ - Diário de justiça, DJE, Data 06/04/2021) (grifei).

Essa posição de maior liberdade regulamentar por parte do Poder Legislativo, no sentido de ser lícito proibir totalmente a propaganda internamente, é compartilhada pelo professor Olivar Coneglian, o qual ensina:

Antes do aparecimento da regra permissiva, a propaganda nas casas legislativas era proibida, pois se tratava de um bem público.

 

 A regra atual (art. 37, § 3º) deixa a critério da mesa diretora de cada casa a veiculação de propaganda eleitoral.

 

Dessa forma, a mesa diretora é livre para proibir ou para permitir. Se permitir, pode regulamentar a questão, internamente: permitir em cada gabinete, mas impedir em áreas comuns; permitir para que a propaganda seja vista por quem está dentro do prédio, e não por quem está fora etc.

 

 O poder da mesa diretora diz respeito também ao tipo de propaganda. Enquanto em outros lugares, só se permitem bandeiras e adesivos, nas casas legislativas não há nenhuma restrição para o tipo de propaganda. Então a mesa pode deliberar também sobre isso, ou deixar que o tipo seja escolhido por cada parlamentar: cartaz, adesivo, banner, foto etc.

 

A Justiça Eleitoral não tem qualquer interferência nessa questão. (CONEGLIAN, 2018, p. 427/428) Nota 11

No entanto, conforme dito alhures, não se compreende essa última posição como a mais adequada juridicamente falando. Ainda que, na questão, se deva ter como norte interpretativo a independência do Poder Legislativo, a liberdade regrada, a meu ver, impede que a Mesa Diretora autorize propagandas defesas, bem como evita que haja total proibição de publicidade interna. Além disso, a contenção propagandística completa nos corredores do Poder Legislativo traria uma desproporcional e anti-isonômica norma em prejuízo dos próprios parlamentares.

Outro ponto digno de menção é que, se o parágrafo 3º suso mencionado for analisado de forma isolada, o intérprete da norma pode concluir, equivocadamente, que ao Poder Legislativo é dado permitir a propaganda eleitoral em suas dependências da forma que lhe aprouver.

Contudo, não é essa a norma que se extrai do texto quando lido em conjunto com o caput e de acordo com uma interpretação sistemática e teleológica da legislação eleitoral.

Ao se perscrutar a intenção da norma, é possível inferir que a mens legis do § 3º do art. 37 da Lei das Eleições (BRASIL, 1997) é, na verdade, possibilitar que a Mesa Diretora permita a divulgação de propaganda eleitoral em suas dependências nos limites legalmente permitidos. Não é possível, por exemplo, que a Mesa Diretora autorize a divulgação de Outdoors no saguão de um prédio do Poder Legislativo para a divulgação de propaganda eleitoral, tendo em vista que os Outdoors para tal finalidade estão impedidos pelo art. 39, § 8º, da Lei nº 9.504/97 Nota 12 (BRASIL, 1997).

Assim, a conclusão a que se chega é que, apesar do § 3º do art. 37 da Lei das Eleições (BRASIL, 1997) preceituar que cabe ao Poder Legislativo decidir sobre a veiculação de propaganda em suas dependências, essa competência não lhe confere poderes para desobedecer a legislação eleitoral, autorizando condutas mais permissivas, mas somente para permitir a realização da propagada eleitoral nos termos da lei ou para restringir a publicidade interna visando equilibrar a disputa, proteger o prédio de eventual poluição visual e evitar contendas internas.

Por fim, cumpre tecer considerações quanto ao poder de polícia no caso de irregularidade em propaganda veiculada nas dependências do Poder Legislativo.

Inicialmente, frise-se que a propaganda eleitoral submete-se ao controle judicial, com vistas à coibição dos abusos. Para tal finalidade a Justiça Eleitoral tem o poder polícia de modo exclusivo, segundo o art. 41, § 1º, da Lei nº 9.504/97 Nota 13 (BRASIL, 1997), podendo, inclusive, agir ex officio, para determinar, por exemplo, que cesse ou seja retirada propaganda violadora das regras pertinentes, mas, claro, isso não implica na possibilidade do juiz eleitoral deflagrar ação ou investigação eleitoral, já que o poder de polícia se restringe às providências necessárias para inibir práticas propagandísticas ilegais.

Na hipótese de eventual ilicitude nas propagandas eleitorais perpetradas no âmbito das Casas Legislativas, não é dado à Mesa Diretora ou quaisquer outras autoridades parlamentares exercerem o poder de polícia quanto à propaganda irregular, sendo exclusividade, nesse ponto, da Justiça Eleitoral agir.

Vejamos mais uma vez o que a doutrina leciona sobre a matéria em testilha:

A Justiça Eleitoral tem o poder de polícia porque ela é, ao mesmo tempo, poder executivo das eleições e poder judiciário das causas eleitorais. O poder de polícia se insere nas atribuições administrativas externas – funções executivas – pelas quais a Justiça Eleitoral comanda e dirige o processo eleitoral.

 (CONEGLIAN, 2020, p. 283 Nota 14)

Conquanto a autorização e regulamentação da propaganda eleitoral, no âmbito interno da Casa Legislativa, submeta-se à discricionariedade da Mesa Diretora, resta assegurada à Justiça Eleitoral o exercício do poder jurisdicional com o fito de evitar ou fazer cessar a veiculação de propaganda em desacordo com as regras legais. (...) No entanto, é vedado que a Mesa Diretora se utilize do poder de polícia – que, na matéria eleitoral, é exclusivo da Justiça Eleitoral-, para o fim de cessar eventual irregularidade. Deparando-se com eventual irregularidade, a Mesa Diretora deve representar junto à Justiça Eleitoral para as medidas cabíveis.

 (ZILIO, 2022, p.455-456 Nota 15)

Destarte, depreende-se que, apesar da liberdade regrada do Poder Legislativo para normatização da propaganda eleitoral em suas próprias dependências, a correção de eventuais irregularidades cabe exclusivamente à Justiça Eleitoral.

 

Conclusão

De todo o que foi exposto, fazendo uma interpretação sistemática e teleológica da legislação eleitoral, especialmente o § 3º do art. 37 da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997 (BRASIL, 1997), conjugada com a independência do Poder Legislativo, com a doutrina mais notável, com jurisprudência do tribunais eleitorais, e com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, compreende-se que a melhor opção jurídica da Mesa Diretora seria normatizar e permitir, ainda que com algumas restrições, a propaganda eleitoral nas dependências do Poder Legislativo, posto que o ato traria segurança jurídica aos parlamentares, e é o mais razoável e isonômico a se fazer em relação aos candidatos titulares de cargos no parlamento.

Frise-se que, apesar de abalizada opinião contrária acima citada, defende-se aqui que seria desproporcional e irrazoável o Poder Legislativo vedar totalmente a propaganda eleitoral em suas dependências.

Por último, sublinhe-se que o Poder Legislativo não pode permitir publicidade eleitoral além do que a própria legislação admite, criando hipóteses inadmitidas, bem como não pode exercer poder de polícia quanto às propagandas eleitorais irregulares, ainda que no âmbito de suas dependências.

 

Nota 01 Procurador do Estado de Goiás, Ex-Procurador da Assembleia Legislativa de Goiás e advogado, ex-servidor da Justiça Eleitoral, membro da Comissão de Direito Político e Eleitoral da OAB-GO, especialista em direito eleitoral. E-mail: daniel@fayadsebba.adv.br

Nota 02 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União. Brasília, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 30 de maio de 2023.

Nota 03 Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Nota 04 Art. 1º Este Código contém normas destinadas a assegurar a organização e o exercício de direitos políticos precipuamente os de votar e ser votado. Parágrafo único. O Tribunal Superior Eleitoral expedirá Instruções para sua fiel execução.

Art. 23 - Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior, IX - expedir as instruções que julgar convenientes à execução deste Código;

Nota 05 BRASIL. Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965. Institui o Código Eleitoral. Diário Oficial da União. Brasília, 1965. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4737compilado.htm. Acesso em: 30 de maio de 2023.

Nota 06 BRASIL. Lei nº 9.504 de 30 de setembro de 1997. Estabelece normas para as eleições. Diário Oficial da União. Brasília, 1997. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9504.htm. Acesso em: 30 de maio de 2023.

Nota 07 TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE PERNAMBUCO. Representação nº 060194002. Rel. Des. Dario Leite. DJE de 26/10/2022. Disponível em https://www.tse.jus.br/jurisprudencia/decisoes/jurisprudencia.

Nota 08 TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DA BAHIA. Representação nº 565. Rel. Des. Pedro de Azevedo. DJE de 24/11/2005. Disponível em https://www.tse.jus.br/jurisprudencia/decisoes/jurisprudencia.

Nota 09 ZILIO, Rodrigo Lopes. Direito Eleitoral. 8. ed. rev., amp. e atual. SP: Juspodivm, 2022, p. 456.

Nota 10 TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARANÁ. Representação nº 06001314320206160139. Rel. Des. Roberto Ribas. DJE de 6/4/2021. Disponível em https://www.tse.jus.br/jurisprudencia/decisoes/jurisprudencia

Nota 11 CONEGLIAN, Olivar. Propaganda Eleitoral. 14. ed. rev. e atual. Curitiba: Juruá, 2018, p. 427-428.

Nota 12 Art. 39 (...) § 8º É vedada a propaganda eleitoral mediante outdoors, inclusive eletrônicos, sujeitando-se a empresa responsável, os partidos, as coligações e os candidatos à imediata retirada da propaganda irregular e ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 15.000,00 (quinze mil reais).

Nota 13 Art. 41 (...) § 1º O poder de polícia sobre a propaganda eleitoral será exercido pelos juízes eleitorais e pelos juízes designados pelos tribunais regionais eleitorais.

Nota 14 CONEGLIAN, Olivar. ELEIÇÕES Radiografia da Lei 9.504/97. 11. ed. rev. e atual. Curitiba: Juruá, 2020, p. 283.

Nota 15 ZILIO, Rodrigo Lopes. Direito Eleitoral. 8. ed. rev., amp. e atual. SP: Juspodivm, 2022, p. 455-456.