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Sistema de Governo Semiparlamentarismo: um parlamentarismo a brasileira

por Alexandre F. AzevedoNota 01

 

1 Introdução

Esse artigo científico tem por objetivo analisar de forma crítica a proposta de sistema de governo parlamentarista apresentado pelo Senador Fernando Collor de Melo e que se encontra em tramitação no Senado Federal. Sistema de governo que já foi denominado de semiparlamentarismo ou semipresidencialismo, exatamente por se apresentar como um tipo de sistema híbrido, uma vez que tenta compatibilizar o presidencialista com o parlamentarista.

Antes de examinarmos a Proposta de Emenda Constitucional, indispensável é gastar algumas linhas para verificar o surgimento desses dois sistemas de governo, bem como apontarmos suas principais características.

 

2 Sistema Parlamentarista

Trata-se de sistema de governo surgido na Inglaterra através de um longo avanço histórico. Segundo Dallari (2012:229), por uma iniciativa do francês Simon de Montfort, cuja avó era inglesa, além de cultivar amizade com barões eclesiásticos da mesma nacionalidade de sua avó, lidera "uma revolta contra o rei da Inglaterra, Henrique III, promovendo uma reunião que muitos apontam como a verdadeira criação do Parlamento".

Afirma o professor Dallari (2012:229) que, embora o Rei João Sem Terra dado início à uma espécie de conselho com a participação de "‘quatro cavaleiros discretos’ de cada condado, para com eles ‘conversar sobre assuntos do reino’", foi Simon Montfort que deu "à reunião o caráter de uma assembleia política, reunindo pessoas de igual condição política, econômica e social".

Mesmo após o falecimento de Morrendo Simon em combate, no ano de 1265, continuou a praxe de se reunirem cavaleiros (nobres que não eram pares do reino), cidadãos e burgueses. E no ano de 1295, o Rei Eduardo I oficializou essas reuniões, consolidando a criação do Parlamento. Com o fortalecimento do Parlamento, que ocorreu de forma gradual, foi criado o Conselho de Gabinete, instância formada por conselheiros privados que eram consultados com certa regularidade.

A guinada, entretanto, para o surgimento do parlamentarismo ocorreu com o falecimento da Rainha Ana e a assunção ao trono inglês do príncipe alemão Jorge, adotando o nome real de Jorge I. Consoante aponta Dallari (2012:230), "nem ele [Jorge I] nem seu sucessor, Jorge II, tinham conhecimento dos problemas políticos ingleses, e não revelaram o menor interesse por eles". Ademais, não falavam inglês e se dirigiam aos seus súditos no Parlamento em latim.

Por esse motivo, o Gabinete continuou a se reunir e "logo um dos ministros, membros do Gabinete, foi se destacando dos demais, liderando o Gabinete e passando a expor e defender suas decisões perante o Parlamento". Esse líder era Roberto Walpole, inicialmente chamado de Primeiro-Ministro por mera ironia.

Passo seguinte, o Parlamento, já no Reinado de Jorge III, ainda mais fortalecido, se indispõe contra a escolha de Lord North como Primeiro-Ministro - escolha feita pelo próprio monarca. Após longa e acirrada disputa política entre o Rei Jorge III e a Câmara dos Comuns - o Parlamento agora já era dividido em duas Casas, sendo a outra a Câmara dos Lordes - o Primeiro-Ministro foi demitido.

Com isso, fixou-se a ideia de que para a escolha de um Primeiro-Ministro seria imprescindível a aquiescência da Câmara dos Comuns (DALLARI, 2012:231).

Passo seguinte, quando a Câmara dos Comuns não concordava com a posição de alguns ministros, utilizava o impeachment para removê-los do cargo. O instituto era utilizado para se punir em razão do cometimento de algum ilícito e, por isso, além de ser retirado do cargo, o ministro ainda sofreria a imposição de pena. "Aos poucos os ministros perceberam ser mais conveniente deixar o cargo logo que se manifestasse o descontentamento do Parlamento em relação à política que estiverem adotando".

Já no século XIX, criou-se a praxe de que a escolha do Primeiro-Ministro seria sempre "um representante da maioria parlamentar, condicionando-se a sua permanência no cargo à manutenção dessa maioria" (DALLARI, 2012:232).

Para atingir essa maioria no sistema inglês é bastante simples, já que se trata de um bipartidarismo. A dificuldade ocorre nos países que adotam um sistema pluripartidarismo. Nestes, deve-se realizar uma coligação, entre os partidos que elegeram representantes, para que seja feita a escolha do Primeiro-Ministro que nem sempre recairá em membro de partido com o maior número de parlamentares.

Por fim, o professor Dallari (2012:232/234) aponta as seguintes características do sistema parlamentarista:

  1. distinção entre Chefe de Estado e Chefe de Governo, sendo que a primeira exercida pelo Monarca ou Presidente - no caso dos países que adotam a República como forma de Governo - e a segunda pelo Primeiro-Ministro;
  2. chefia de governo com responsabilidade política perante o Parlamento, que poderá determinar a sua demissão.
    Essa demissão poderá ocorrer em duas situações: 1ª) perda da maioria parlamentar; 2ª) voto de desconfiança;
  3. possibilidade de dissolução do Parlamento, que poderá ocorrer "quando o Primeiro-Ministro percebe que só conta com uma maioria e acredita que a realização de eleições gerais irá resultar numa ampliação dessa maioria" e, o que é mais comum no sistema pluripartidarista, "quando o Primeiro-Ministro recebe um voto de desconfiança, mas entende que o Parlamento é que se acha em desacordo com a vontade popular". (DALLARI, 2012:234).

Vê-se, portanto, que a figura central no sistema de governo parlamentarista é o Parlamento, composto por representantes do povo, devendo o chefe de governo não apenas prestar-lhe contas, mas submeter-se à sua vontade.



3 Sistema Presidencialista

O sistema presidencialista, em oposição ao sistema parlamentarista, não nasceu de uma longa evolução histórica, sendo uma criação norte-americana, fruto da aversão que os colonos sentiam em relação ao absolutismo inglês. Como ensina Dallari (2012:237):

A péssima lembrança que tinham da atuação do monarca, enquanto estiveram submetidos à coroa inglesa, mais a influência dos autores que se opunham ao absolutismo, especialmente de Montesquieu, determinaram a criação de um sistema que, consagrando a soberania da vontade popular, adotava ao mesmo tempo um mecanismo de governo que impedia a concentração de poder.

Como mecanismo de controle, e prevenção, à concentração de poderes, os norte-americanos criaram um forte mecanismo de freios e contrapesos, que consiste em interferências recíprocas dos três Poderes - Executivo, Legislativo e Judiciário.

Esse sistema de interferências recíprocas, encerrado na conhecida fórmula cheques and balances, já havia sido apontado por Montesquieu, como acima sublinhado, como uma providência necessária para que um poder pudesse limitar o outro poder. (CUNHA Jr., 2011:993).

Os ideais do Barão francês encontram-se escritos em sua célebre obra "Do Espírito das Leis" donde se extrai o seguinte excerto que nos releva a necessidade e, para além, a utilidade da divisão dos poderes:

Quando em uma só pessoa, ou em um mesmo corpo de magistratura, o poder legislativo está reunido ao poder executivo, não pode existir liberdade, pois se poderá temer que o mesmo monarca ou o mesmo senado criem leis tirânicas para executá-las tiranicamente.

Também não haverá liberdade se o poder de julgar não estiver separado do poder legislativo e do executivo. Se o poder executivo estiver unido ao poder legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário, pois o juiz seria o legislador. E se estivesse ligado ao poder executivo, o juiz poderia ter a força de um opressor. (MONTESQUIEU, 2003:166)

Possui o sistema presidencialista os seguintes pontos característicos, consoante nos aponta Dallari (2012:239/241):

  1. o Presidente da República ocupa, a um só tempo, as funções de Chefe de Estado e de Chefe do Governo. Como a chefia do poder executivo é unipessoal, cabe ao Presidente da República a definição das diretrizes que o governo seguirá, podendo montar o seu gabinete sem a interferência do Parlamento. Assim, apenas o Presidente possui a responsabilidade política e poderá demitir livremente o seu gabinete.
  2. o Presidente da República é escolhido pelo povo para cumprir um mandato com prazo determinado. Alguns países admitem o instituto da reeleição para um mandato imediatamente consecutivo, outros proíbem de forma drástica a reeleição.
  3. o Presidente da República tem poder de veto. Esse poder permite que o Chefe do Poder Executivo não seja feito refém de uma verdadeira ditadura do legislativo, sendo reduzido a simples executor de leis, "lhe foi concedida a possibilidade de interferir no processo legislativo através de veto" (DALLARI, 2012:241). Entretanto, em algumas poucas ocasiões, quando se tratar de competências exclusivas, o Poder Executivo não participará do processo legiferante. É o caso, entre nós, do Decreto Legislativo e da Emenda Constitucional.

Tendo essa visão panorâmica dos dois sistemas de governo, veremos, adiante, a PEC ora em tramitação no Senado Federal.

 

4 Do sistema de governo previsto na PEC 32/2015

A Proposta de Emenda Constitucional apresentada pelo Senador Fernando Collor de Melo prevê a alteração de vários dispositivos Constitucionais visando criar uma vertente do Parlamentarismo.

Pela proposta, ter-se-á o Presidente da República e o Presidente do Conselho de Ministro - que exercerá a função de Primeiro-Ministro como se verá adiante. O Presidente será eleito mediante o sistema majoritário de maioria absoluta, sendo extinto o cargo de vice-presidente.

Tendo sido empossado, caberá ao Presidente da República nomear o Presidente do Conselho de Ministro. Também deverá nomear os demais Ministros de Estado, que serão indicados pelo Presidente do Conselho. A exoneração dos Ministros também ficará a cargo do Presidente da República, quando a Câmara dos Deputados lhe retirar a confiança.

O processo legislativo também foi objeto de alteração. Primeiro que o Presidente da República não terá iniciativa para apresentar Projetos de Leis. Tal iniciativa foi passada para o Primeiro-Ministro. Entretanto, caberá ao Presidente da República sancionar ou vetar os Projetos de Lei aprovados pelo Congresso Nacional. Interessante que pela PEC 32/2015, no caso de sancionar proposições legislativas, deverá ouvir o Primeiro-Ministro.

Sobre as Forças Armadas, o comando ainda permanece com o Presidente da República, embora seja retirado o vocábulo "supremo". Sobre as nomeações dos comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica, caberá ao Primeiro-Ministro apresentar propostas.

A organização dos cargos públicos federais, mediante decreto - sem aumento de despesa ou extinguir os cargos quando estiverem vagos - permanece, entretanto, a proposta partirá do Primeiro-Ministro. De igual modo, a decretação do estado de sítio, defesa e de intervenção federal.

Por fim, caberá ao Presidente da República dissolver a Câmara dos Deputados caso haja a rejeição de três indicações para Primeiro-Ministro.

Sobre a formação do Conselho de Ministros, caberá ao Presidente da República a nomeação do Primeiro-Ministro, que será submetido à aprovação da Câmara dos Deputados - maioria absoluta. Nesta mesma ocasião, a Câmara dos Deputados apreciará o plano de governo e os nomes dos demais Ministros.

Sendo rejeitada, caberá ao Presidente da República, no prazo de 03 (três) dias, indicar novo nome. Sendo rejeitado, em idêntico prazo, deverá o Presidente da República fazer outra indicação, em caso de não aprovação, caberá a dissolução da Câmara baixa.

Além disso, uma vez formado o Conselho de Ministros, poderá a Câmara dos Deputados, apresentada moção de desconfiança, subscrita por no mínimo 30% dos integrantes da Casa, e sendo aprovada pela maioria absoluta da Casa, impor a substituição do Conselho. Também importará a exoneração dos membros do Conselho de Ministros, a rejeição de medida provisória pela maioria absoluta dos representantes do povo.

Se a Câmara dos Deputados, por três vezes consecutivas, impor a substituição do Conselho, o Presidente da República deverá dissolvê-la e convocar novas eleições. É o que se prevê a PEC 32/2015, dando a seguinte redação ao artigo 87 da Constituição Federal:

Art. 87. O Conselho de Ministros responde coletivamente perante a Câmara dos Deputados pela política do Governo e pela Administração Federal, e cada Ministro, individualmente, pelos atos que praticar no exercício de suas funções.

§ 1º À exceção do previsto nos incisos I, II, X, XIII, XX e XXI do art. 83, todos os atos do Presidente da República devem ser referendados pelo Presidente do Conselho e pelo Ministro competente, como condição de sua validade.

§ 2º O Presidente do Conselho de Ministros deverá ter idade mínima de trinta e cinco anos e terá a designação de Primeiro-Ministro.

§ 3º O Presidente do Conselho de Ministros será escolhido pelo Presidente da República e submetido à aprovação da maioria absoluta da Câmara dos Deputados que decidirá sobre sua aceitação, o respectivo plano de governo e os nomes que comporão o Conselho de Ministros no prazo de 48 horas, em turno único, por voto secreto.

§ 4º Não obtendo a aprovação da maioria absoluta da Câmara, caberá ao Presidente da República a indicação, no prazo de três dias, de outro nome de sua preferência para o mesmo cargo.

§ 5º Recusada a aprovação, o Presidente da República deverá, em igual prazo, apresentar outro nome; se também este for recusado, o Presidente da República dissolverá a Câmara dos Deputados, convocando novas eleições que se realizarão no prazo máximo de 90 (noventa) dias.

§ 6º Em caso de renúncia do Presidente do Conselho de Ministros, proceder-se-á na forma do disposto nos parágrafos anteriores.

§ 7º A moção de desconfiança em face do Conselho de Ministros só poderá ser apresentada se subscrita por, no mínimo, trinta por cento dos integrantes da Câmara dos Deputados e for acompanhada de proposta da composição de um novo Conselho e do respectivo programa de Governo que, aprovados pela maioria absoluta da Casa, ensejarão a substituição do Conselho.

§ 8º Verificada a impossibilidade da manutenção do Conselho de Ministros por falta de apoio parlamentar, comprovada em moções de desconfiança aprovadas, consecutivamente, em face de três Conselhos, o Presidente da Republica poderá dissolver a Câmara dos Deputados, convocando novas eleições que se realizarão no prazo máximo de 90 (noventa) dias, a que poderão concorrer os parlamentares que hajam integrado os Conselhos dissolvidos.

§ 9º A Câmara dos Deputados dissolvida, nos termos dos §§ 5º e 8º, permanecerá no exercício de suas funções até a posse dos novos deputados federais eleitos.

§ 10. A rejeição de medida provisória, por maioria absoluta da Câmara, importará na exoneração dos membros do Conselho de Ministros.

(Sem grifos no original)


Nas reuniões do Conselho de Ministro, caberá ao Presidente da República a direção e, não estando presente, ao Primeiro-Ministro. Suas deliberações serão tomadas pela maioria de votos, havendo empate, o Primeiro-Ministro desempata. Cada Ministério terá um Ministro e um Vice-Ministro. Em caso de destituição do Ministro, caberá ao Vice-Ministro conduzir a pasta até a constituição de outro.

Deste modo, caberá ao Conselho de Ministros a Administração do Governo Federal, necessitando, porém, para determinadas ações, de ato do Presidente da República.

Um ponto deveras interessante na PEC 32/2015 é permitir que os Estados decidam se adotarão, ou não, o sistema parlamentarista em seus territórios. É o que prevê o artigo 6º, da PEC 32/2015:

Art. 6º Os Estados decidirão sobre a adoção do sistema parlamentarista em seus respectivos territórios, observados os princípios desta Constituição.

Sem grifos no original

Tal redação do artigo 6º, quando diz "em seus respectivos territórios" autoriza o seguinte questionamento: será possível aos Estados da Federação adotarem o sistema semiparlamentarista nos Municípios ou ficará limitado ao âmbito estadual?

A adoção de tal sistema para o âmbito municipal é, deveras, uma boa temática para se pensar e amadurecer as ideias, eis que a administração por um corpo de pessoas, ao invés de um ente unipessoal terá suas virtudes. Em verdade, talvez seria até melhor a extinção do cargo de prefeito - chefe de Estado? - deixando a administração a cargo de um secretariado escolhido pela Câmara de Vereadores, mas, a toda evidência, isso é assunto para um outro momento.

 

5 Do Parlamentarismo na política Brasileira

O Brasil já teve a oportunidade de vivenciar o sistema parlamentarista por duas vezes. Infelizmente, em nenhuma delas, pelo clamor popular ou pela via democrática.

A primeira experiência parecida com o parlamentarismo no Brasil surgiu com a abdicação do trono por Dom Pedro I, assumindo o posto o Imperador Dom Pedro II. Ocorre que, dada a sua pouca idade - apenas 05 anos de idade - o governo ficou a cargo de uma Regência Trina e, posteriormente, uma Regência Una. A toda evidência, essa situação não pode ser caracterizada como adoção de um sistema parlamentarista, eis que foi fruto de uma eventualidade. E mais, sanada assim que foi declarada a maioridade Dom Pedro II, aos 15 anos.

Como aponta o propositor da PEC 32/2015, diz-se, ainda, que no Império foi adotado o sistema parlamentarista com a edição do Decreto nº 523, de 20 de julho de 1847, que teve, parcamente, a seguinte redação:

Crea hum Presidente do Conselho dos Ministros.

Tomando em consideração a conveniencia de dar ao Ministerio huma organisação mais adaptada ás condições do Systema Representativo: Hei por bem crear hum Presidente do Conselho dos Ministros; cumprindo ao dito Conselho organisar o seu Regulamento, que será submettido á Minha Imperial Approvação. Francisco de Paula Sousa e Mello, do Meu Conselho d'Estado, Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do Imperio, o tenha assim entendido, e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em vinte de Julho de mil oitocentos quarenta e sete, vigesimo sexto da Independencia e do Imperio.

Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Francisco de Paula Sousa e Mello.

Com a devida vênia aos defensores dessa ideia, não custa lembrar que, de acordo com a Constituição outorgada de 1824, o Brasil possuía, nessa época, não três, mas quatro poderes. Além do Executivo, Legislativo e do Judiciário, ainda existia o Poder Moderador, responsável pela guarda da harmonia e independência dos demais poderes, sendo-lhe facultado, para tanto, anular os atos emanados por aqueles.

Logo, esse Conselho de Ministros não passava de um mero gabinete do Poder Executivo.

Outra experiência parlamentarista experimentada no Brasil ocorreu na década de 1961. Naquela época, o Presidente Jânio Quadros renunciou ao cargo, apenas 07 meses após a posse, estando o seu Vice-Presidente, João Goulart, em viagem à China. Deve-se, mencionar que, naquela época, havia duas eleições: uma para Presidente e outra para Vice-Presidente.

Esse sistema foi imposto à política nacional por meio da Emenda Constitucional nº 4, de 1961.

Tal sistema vigorou até meados de janeiro de 1963 quando, por meio de consulta popular, o povo disse não ao parlamentarismo.Nota 02 Infelizmente, à queda do sistema, seguiu-se a queda da própria democracia.

Finalmente, restaurada a ordem democrática, a Constituição Federal de 1988, promulgada no dia 05 de outubro, previa, em seu artigo 2º, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias que, no dia 07 de setembro de 1993, fosse realizado um plebiscito sobre a forma de Governo - República ou Monarquia - e o sistema de Governo - Presidencialismo ou Parlamentarismo. Veja-se:

Art. 2º No dia 7 de setembro de 1993, o eleitorado definirá, através de plebiscito, a forma (república ou monarquia constitucional) e o sistema de governo (parlamentarismo ou presidencialismo) que devem vigorar no País. (Vide emenda Constitucional nº 2, de 1992) [Planalto].

§ 1º Será assegurada gratuidade na livre divulgação dessas formas e sistemas, através dos meios de comunicação de massa cessionários de serviço público.

§ 2º O Tribunal Superior Eleitoral, promulgada a Constituição, expedirá as normas regulamentadoras deste artigo.

Convocado às urnas, o povo, em sua maioria, rejeitou, novamente, o sistema parlamentarismo, bem como a forma monárquica de Estado.

Como houve a convocação do povo, e este, soberanamente, disse não à proposta de introdução do sistema parlamentarismo na vida democrática brasileira, a sua reinserção, à revelia da vontade popular afrontaria o princípio esculpido no artigo 1º, parágrafo único, da Constituição Federal, segundo o qual, "todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição."

 

6 À Guisa de Conclusão

A inserção, ou reinserção, do sistema parlamentarismo entre nós, não é algo novo, antes o contrário, sempre esteve presente no imaginário de algumas vozes intelectuais e partidárias.

Entrementes, a sua introdução, mediante Projeto de Emenda Constitucional, à exemplo da PEC 32/2015, sem se passar pelo crivo popular - plebiscito ou referendo - estará maculado de inconstitucionalidade material, eis que fere mortalmente o princípio da soberania popular, considerando que o povo brasileiro, sobre essa questão, já se manifestou por duas oportunidades diversas. E, em todas as duas vezes, a rejeitou majoritariamente.

Se por um lado não existe uma panacéia - uma cura para todos os males - para a incipiente experiência democrática brasileira, de outro lado, deve-se sempre buscar na experiência vivida por outros países, tentar encontrar a solução para os problemas democráticos desse país.

 

Nota 01 Mestre em Direito, com orientação em Direito Eleitoral comparado. Professor de Direito Eleitoral na Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Professor de Direito Internacional Público na Faculdade UNIFAN. Técnico Judiciário do Tribunal Regional Eleitoral de Goiás.

Nota 02 Disponível em Emenda Parlamentarista completa 50 anos [Câmara dos Deputados].