Artigos de Memória Institucional

 

A Justiça Eleitoral em 1932 e a Criação de Zonas Eleitorais no Estado de Goiás

por Daniel Galuch Júnior01

 

Em , por meio do Decreto nº 21.076, a legislação eleitoral brasileira foi unificada numa lei. Ele nasceu de reivindicações e insatisfações com o antigo regime. A redação ficou a cargo da 19ª subcomissão legislativa criada pelo Decreto 19.459/1930. Os principais idealizadores do Código Eleitoral de 1932 (Assis Brasil e João Cabral) imaginavam uma especial magistratura, independente dos arbítrios dos governos, com função judicante distinta da função técnica e administrativa. Outros países já tinham delegado poderes de forma permanente ao Poder Judiciário a organização das eleições, como por exemplo, o Uruguai (Cabral, ).

A criação da Justiça Eleitoral esteve calcada na ideia segundo a qual os pleitos deveriam ser mais transparentes e se destinava a coibir as fraudes até então existentes no processo eleitoral brasileiro. Outras inovações foram a adoção do voto feminino, a obrigatoriedade do alistamento e do voto secreto, a representação proporcional e a criação da Justiça Eleitoral.

Coube aos magistrados vitalícios e ao Poder Judiciário (não mais o Poder Executivo) a missão de mudar o paradigma dos processos eleitorais viciados e corruptos do início do século XX. Na exposição de motivos para a constituição do Plano de divisão de zonas eleitorais de Goiás, o Tribunal teve dificuldade de preencher todas as zonas eleitorais com juízes vitalícios, principalmente nas comarcas do norte.

Para fins de divisão eleitoral o Código Eleitoral instituiu o Tribunal Superior Eleitoral, sediado na capital da República, como a corte mais alta do país e ente competente para o planejamento e gestão do território brasileiro conforme seus peculiares interesses. Era função do TSE homologar as zonas eleitorais.

Com competência concorrente, coube aos Estados membros, instituídas nos Tribunais Regionais, sediados nas capitais, organizar e executar a descentralização da Instituição. No caso goiano, a capital ainda era o município de Goiás. Esta comarca era a única com duas varas e poderia ter no caso em questão, duas zonas eleitorais.

Os Estados eram denominados “região eleitoral” e conforme preconizava o artigo 24 do Código Eleitoral, era atribuição dos Tribunais a divisão imediata do território da sua jurisdição em zonas para instalação de varas eleitorais e os ofícios para iniciar os serviços indispensáveis para a realização de pleitos. Assim, as Unidades da Federação estabeleceram uma divisão eleitoral inspirada na organização judiciária, com origem na divisão política-administrativa das unidades federativas.

O processo de criação em zonas eleitorais não foi tão simples devido à vastidão do território brasileiro sem ocupação e com pouca presença das instituições públicas. Percebe-se que a organização e divisão judiciária de cada estado são agrupadas em comarcas, que podem abranger um ou mais municípios, distribuídos de forma desigual pelo território. Com exceção parcial do Estado de São Paulo, todos os estados foram divididos em tantas zonas eleitorais quantas são as comarcas atualmente existentes. Era permitida junção ou separação de alguns municípios na formação das zonas, levavam em conta na divisão, o bem-estar do eleitor, com critérios da menor distância e da maior facilidade de locomoção e comunicação. No caso de Goiás, a preocupação e a vontade do TRE era que cada município fosse uma zona eleitoral, com a justificativa de municípios com grandes extensões territoriais e cidades longe uma das outras, independente da população residente.

Após muito conflito jurídico durante o ano de , pacificou-se a matéria e conclui-se que “zona eleitoral é a porção do território sujeita á jurisdição e competência do juiz eleitoral vitalício” (Processo nº 46 - Acórdão de 3-9-1932 - Boletim Eleitoral nº 31 - p. 493) e que “não pode constituir zona, um município ou distrito com autoridade judiciária que não goze de vitaliciedade” (Ac. nº 1 - Boletim Eleitoral nº 4 - p., 30-8-1932) e, finalmente, que “nos municípios onde não existem juízes locais vitalícios, deve ser designado um cartório eleitoral para o fim de preparar os processos” (Ac. 18 - Bol. Eleit. nº 7 - p. 59 - 17-8-1932).

Segundo o boletim eleitoral publicado em , o Tribunal Regional Eleitoral de Goiás foi instalado em 20 de agosto e a divisão eleitoral, composta de 56 municípios agrupados em 23 zonas eleitorais, aprovada em 1º de setembro, publicada no Correio Oficial 2282 de 03 de setembro e homologado pelo TSE em 13 de dezembro. A aprovação da divisão eleitoral foi presidida pelo Des. Maurílio Augusto Curado Fleury.

A título de síntese, o quadro 01 expõe a relação de Estados, municípios e Zonas Eleitorais em 1933, embasadas nos Boletins Eleitorais e nas publicações do IBGE. Deste modo, destacaremos Goiás dentro da estrutura de primeiro grau da Justiça Eleitoral.

 

Quadro 1: Relação de Estados, Municípios e Zonas Eleitorais em

ESTADOS MUNICÍPIOS ZONAS ELEITORAIS
Território do Acre 5 5
Alagoas 33 15
Amazonas 28 16
Bahia 125 51
Ceará 51 26
Distrito Federal 1 9
Espírito Santo 30 20
Goiás 56 23
Maranhão 53 23
Mato Grosso 25 19
Minas Gerais 214 125
Pará 37 26
Paraíba 38 18
Paraná 52 31
Pernambuco 83 15
Piauí 27 26
Rio de Janeiro 48 45
Rio Grande do Norte 42 29
Rio Grande do Sul 88 44
Santa Catarina 44 24
São Paulo 270 136
Sergipe 42 12
BRASIL 1.575 753

Fonte: IBGE – Número de municípios brasileiros: Divisão Territorial do Brasil de 1933 e número de zonas eleitorais: boletins eleitorais de e panorama eleitoral de

 

Concluímos sobre a particularidade de cada Unidade Federativa ter critérios próprios para criação de comarcas. A densidade demográfica, população municipal, receita tributária, número expressivo de feitos judiciais foram critérios atuais utilizados pelos Estados para efetivar a estrutura judiciária. Goiás se preocupou com a vastidão dos territórios a população alistável, as cidades e vilas uma das outras. Com o grau de exigência para a instalação de nova Justiça, a criação da Justiça Eleitoral foi um dos motivos para organizar também a estrutura do Poder Judiciário após a revolução de , quando os membros do TRE declararam que o Poder Executivo providenciaria juízes vitalícios togados para todas as comarcas.

 

Plano de divisão do Estado de Goiás em zonas eleitorais.


Referências Bibliográficas

BOLETIM ELEITORAL de . Tribunal Superior Eleitoral. Brasília. Disponibilizado pela Biblioteca do TSE. Arquivo em PDF.

CABRAL, João C. da Rocha. Código Eleitoral da República dos Estados Unidos do Brasil – . Acessado em . https://www.tse.jus.br/hotsites/catalogo-publicacoes/pdf/codigo_eleitoral_1932.pdf

GALUCH JUNIOR, Daniel. Organização socioespacial do eleitorado no Brasil - Estudo das zonas eleitorais entre a . Maringá: Universidade Estadual de Maringá. https://bibliotecadigital.tse.jus.br/xmlui/handle/bdtse/536

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE Nova edição do Atlas Nacional revela transformações do território brasileiro. Acessado em , revisto em https://censo2010.ibge.gov.br/noticias-censo.html.

01 Daniel Galuch Júnior é analista judiciário do TRE/PR, formado em Direito e Geografia, ambas pela Universidade Estadual de Maringá - UEM, pós graduação em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Paraná - UFPR, ministrou a disciplina História do Eleitoral e Partidário na UNINTER, onde também é graduando em Ciência Política. O foco de seu estudo é sobre memória e zonas eleitorais do Brasil. Foi organizador da edição comemorativa da Revista Paraná Eleitoral, edição 65 anos, com a publicação do Atlas Eleitoral do Paraná - eleições para Governador (-). E-mail é danielgj@tre-pr.jus.br