Verba Legis 2025

Ações do Tribunal

 

Eleições Proporcionais – Comentários

por Escola Judiciária Eleitoral

 

De acordo com a atual legislação eleitoral brasileira, são identificadas duas formas distintas de se eleger candidatos, mediante os denominados sistemas eleitorais "proporcional e majoritário".

No sistema majoritário, será eleito simplesmente o candidato que receber mais votos. Referida forma é utilizada nas eleições para os cargos de prefeito, governador, senador e presidente da república. Já o sistema proporcional é usado para definição, além dos vereadores das cidades, também dos deputados estaduais e federais.

Para as eleições, então, destinadas à escolha dos citados membros do Poder Legislativo, a legislação eleitoral possui regras que garantem uma "representação proporcional" da população em geral nessas casas, levando-se em conta não somente os candidatos mais votados pelos eleitores (prisma individual), assim como o desempenho nas urnas dos partidos ou legendas concorrentes (prisma coletivo).

Nas eleições denominadas proporcionais, portanto, no momento da votação, os eleitores manifestam não somente uma, mas na realidade duas intenções. Ao digitar os dois primeiros números, inicialmente o eleitor indica que a legenda, integrada pelo parlamentar que está sendo votado, tenha coletivamente mais cadeiras na casa legislativa do que as outras coligações.

Posteriormente, quando se digita os três últimos números finais, o eleitor então registra qual candidato específico deverá ocupar uma das cadeiras que serão destinadas àquela legenda, ou seja, há a definição de quem integrará uma das vagas reservadas ao partido político ou coligação dentro da casa legislativa – Câmara dos Vereadores, Assembleia Legislativa, Câmara dos Deputados.

Assim, salvo para o Senado Federal (Eleições Majoritárias), as eleições parlamentares tem a característica de proporcionalidade – eleições proporcionais – na qual de início são reservadas cadeiras para os partidos, coligações ou legendas que foram mais votados pelos eleitores. Portanto, inicialmente, ocuparão um maior número de vagas/cadeiras dentro do parlamento, os partidos/legendas com um melhor desempenho global – maior quantidade de votos válidos – durante o pleito eleitoral.

Ratifique-se, portanto, que a ideia de eleições proporcionais manifesta-se, em primeiro plano, pela vontade de toda a coletividade demonstrada nas urnas pelo eleitorado votante, possibilitando que os partidos políticos ou legendas com mais votos válidos tenham um benefício coletivo ou global pelo bom desempenho, devendo ocupar naturalmente um maior número de cadeiras dentro do parlamento.

Posteriormente, após a definição das legendas de maior representatividade e da quantidade de cadeiras na casa legislativa que elas irão ocupar (Quociente Partidário), deve ser permitido que os integrantes/candidatos mais votados desses partidos ou legendas ocupem essas vagas já separadas, pressupondo-se sempre o alcance de uma espécie de "nota de corte", ou seja, cada candidato individualmente deverá apresentar um número mínimo de votos necessários para que possa integrar o parlamento (10% do Quociente Partidário).

Essa seria a primeira fase da apuração de eleições para membros do Poder Legislativo, por meio do sistema proporcional de votação, no qual os parlamentares eleitos são inicialmente definidos mediante critérios de classificação que têm como base os cálculos do denominado quociente eleitoral e do quociente partidário.

Além disso, entretanto, quando os partidos e candidatos não atingem os requisitos necessários para preencher todas as vagas, as cadeiras restantes — também denominadas de "sobras" — são distribuídas em uma segunda fase de apuração utilizando-se o cálculo da média de votação.

Então, na prática, o primeiro requisito verificado para que o candidato seja eleito na eleição proporcional é a obtenção de uma votação de no mínimo 10% do quociente eleitoral – "nota de corte individual". Após, é verificado se o candidato deverá também estar entre os mais votados do seu partido ou federação. A entrada dos eleitos no parlamento, ao final, deverá observar um limite baseado no quociente partidário, que estabelecerá a quantidade máxima de cadeiras conquistadas pelo partido (primeira fase).

Ademais, para efeitos dos referidos cálculos, as federações partidárias são consideradas como um único partido político.

Registre-se que diferentemente das eleições majoritárias, as vagas conquistadas em eleições proporcionais pertencem prioritariamente aos partidos. Assim, o candidato eleito para tais vagas somente poderá se desfiliar durante a denominada janela partidária — período de 30 dias anteriores ao prazo de filiação para concorrer à outra eleição. Caso identificado um desvio do programa partidário ou grave discriminação por parte da agremiação, também há a configuração de uma justa causa para troca de partido, sendo que mudanças de legenda para além desses motivos podem levar à perda do mandato.

Com base nas premissas acima referenciadas, explicaremos a seguir os requisitos de desempenho, de natureza individual ou coletiva, para que o candidato seja eleito e efetivamente ocupe uma cadeira no parlamento por meio de eleições majoritárias.

O quociente eleitoral é determinado por meio da divisão do total de votos válidos para um cargo pelo número de vagas (cadeiras) a serem preenchidas no parlamento. Considera-se "voto válido", por oportuno, todo voto dado a um candidato ou a um partido, ou seja, a votação total de uma eleição desconsiderados os votos em branco e nulos.

Por exemplo, nas Eleições Municipais de 2024 na cidade de Rio Verde - GO, foram contabilizados 110.175 votos válidos para o cargo de vereador. Naquele ano, a Câmara Municipal tinha 21 cadeiras a serem preenchidas. Logo, o quociente eleitoral em Rio Verde - GO foi de 5.246,42. No caso de resultados fracionados, o valor após a vírgula é arredondado (Art. 106 do Código Eleitoral).

Ou seja, o primeiro requisito que um candidato a vereador rio-verdense precisou cumprir naquela eleição foi conquistar ao menos 524,60 votos do seu eleitorado (10% do quociente eleitoral – art. 108 do Código Eleitoral).

Já o quociente partidário é o que define o número de cadeiras às quais cada agremiação terá direito. Ele é determinado dividindo o total de votos válidos que o partido ou federação obteve pelo quociente eleitoral (Art. 107 do Código Eleitoral).

Ainda no mesmo exemplo do cenário de Rio Verde - GO em 2024, considere que o partido "A" tenha recebido 20 mil votos, entre votos nominais (conquistados pelos seus candidatos) e os de legenda (votos dados direto ao partido).

Ao dividir os 20 mil votos pelo quociente eleitoral em Rio Verde - GO (5.246), chegamos ao quociente partidário de 3,81. Para este cálculo, os valores fracionados são desprezados, o que significa que o partido em questão teria conquistado 3 vagas para o cargo de vereador no município.

Portanto, para se eleger vereador em Rio Verde - GO no ano de 2024, um candidato que concorreu pelo partido "A" teria que conquistar no mínimo 524 votos e estar entre os três mais votados do seu partido.

Finalmente, após a citada distribuição das vagas por meio destes cálculos (1ª etapa), é natural que nem todas as cadeiras sejam preenchidas, restando as denominadas "sobras". Para a adequada ocupação dessas cadeiras remanescentes (2ª etapa), deve ser utilizado o cálculo da "média" de cada partido.

Essas denominadas "sobras por média", cadeiras vagas a serem preenchidas ainda com base no desempenho de cada partido, são determinadas pela quantidade de votos válidos por eles recebidos dividida pelo quociente partidário mais 1. Assim, o partido ou federação com maior média leva cadeira ainda vaga (sobra). Agora, se mais de uma cadeira estiver sobrando, essa operação é refeita acrescentando mais 1 ao divisor do partido que recebeu a vaga anterior.

Devemos frisar que somente participam dessa etapa de repescagem, os partidos que tenham obtido no mínimo 80% do quociente eleitoral e, dessas legendas, todos os candidatos que tenham conseguido votação igual ou superior a 20% desse mesmo quociente – Cláusula de Barreira ou de Desempenho. Nas últimas eleições do município de Rio Verde – GO, das 21 vagas de vereador disputadas, 13 vagas foram preenchidas pelo critério de quociente partidário e 8 foram destinadas mediante essa fase de repescagem – sobras por média (2ª etapa).

Além do que já foi exposto, segundo a própria legislação eleitoral, na hipótese de impossibilidade do preenchimento de todas as vagas seguindo as citadas cláusulas de barreira ou critérios de desempenho 80/20 (incisos I e II do art. 109 do Código Eleitoral – sobras por média), será executada uma nova rodada de distribuição das cadeiras que continuarem sem representantes, são as chamadas "sobras das sobras" (3ª etapa).

Pontue-se que para as eleições municipais de 2024, o regramento acerca dessa segunda fase de repescagem "sobras das sobras" foi modificado. Nessa etapa final, até as Eleições Gerais de 2022 ainda participavam apenas os partidos que atingiram 80% ou mais do quociente eleitoral, sendo eliminado o critério de 20% para os candidatos.

Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (ADIs nºs 7228, 7263 e 7325) no mês de fevereiro de 2024 declarou a inconstitucionalidade desse dispositivo, eliminando também o patamar de 80% para os partidos. Agora, a partir das eleições de 2024, todos os partidos e federações podem concorrer às últimas vagas (sobras das sobras), que são obtidas diretamente pelas legendas que tiverem a maior média e ocupadas pelos seus candidatos mais votados, sem a utilização dos limites percentuais mínimos acima descritos - cláusula de barreira ou desempenho 80/20.

No citado julgamento, portanto, a Suprema Corte entendeu que no caso de nenhum partido alcançar o quociente eleitoral – ocorrerá uma repescagem em dois ciclos para preenchimento das cadeiras remanescentes do parlamento (sobras por média e "sobra das sobras") – aplicando-se, sucessivamente, o inciso I c/c o § 2° e, na sequência, o inciso III do art. 109 do Código Eleitoral/1965, de maneira que a distribuição das cadeiras ocorra, primeiramente, com a aplicação da cláusula de barreira 80/20 e, quando não houver mais partidos e candidatos que atendam tal exigência, as cadeiras restantes sejam distribuídas por média, com a participação de todos os partidos, ou seja, direcionando essas últimas vagas do parlamento aos candidatos mais votados, sem exigência de cláusula de desempenho partidário (80%), em estrito respeito ao sistema proporcional.

Conforme cediço, nesta última fase de distribuição das vagas remanescentes (sobras das sobras), a restrição imposta pela cláusula de desempenho 80/20 (Código Eleitoral/1965, art. 109, § 2º) ofende o pluralismo político (CF/1988, art. 1º, V) e exclui do Poder Legislativo cidadãos com altíssima densidade eleitoral em favor de candidatos com baixa representatividade, beneficiando os grandes partidos e dificultando a efetiva participação de partidos menores.

A Suprema Corte, ao prestigiar o princípio democrático, isonomia e do caráter proporcional das eleições parlamentares, permitiu que ao menos na última fase de apuração das eleições proporcionais se possibilite a ocupação de lugares nas casas legislativas por partidos pequenos integrados por candidatos que obtiveram o mérito de uma expressiva votação no certame eleitoral.

A par de todos os fundamentos aqui elencados, também identificamos a manifesta existência de compatibilidade material entre a Constituição Federal e a conclusão hermenêutica de que doravante será garantida a participação indistinta de todos os partidos políticos na última etapa de distribuição das vagas das eleições proporcionais, independentemente de terem obtido número de votos equivalente à determinada porcentagem pré-definida do quociente eleitoral (cláusula de barreira ou desempenho).