Verba Legis 2018

Memória da Justiça Eleitoral

 

1965: Um recorte histórico da disputa eleitoral em Goiás

 

Política e animosidade. Não é demais dizer que, desde que o homem organizou-se em sistemas políticos, a disputa é uma constante. Cada qual nos moldes de seu tempo, utilizam os candidatos das ferramentas que lhes restam à disposição para alcançar o intento de chegar ao comando ou à representação, sendo a palavra a maior das armas.

Muito se diz acerca da moderna influência das Fake News no processo eleitoral. Mas, afinal, será mesmo que tais instrumentos de convencimento, sejam eles mais ou menos bem intencionados, realmente são algo novo?

Estamos uma vez mais em . A então “rede social” conhecida eram os impressos matinais, que se convertiam em temas diários nas antigas barbearias, padarias e cafés. Entre um biscoito e outro, ali também se debatia política, talvez com um fervor mais próximo da realidade palpável do que hoje podemos imaginar. Brasília era então uma novidade que soava ainda como aposta, e a política consolidada da região Centro-Oeste concentrava-se em solo goiano.

Em disputa, o governo do Estado de Goiás e, aqui, cumprindo o papel de (pretensa) imparcialidade, uma vez mais revivemos aquela que foi uma das maiores disputas eleitorais já registradas em nossas terras, seja pelo momento histórico, seja pelas figuras histórias então vivas, atuantes e longe ainda das lendas que vieram a se tornar.

Façamos então um esforço de abstração. Imaginemos, por um momento, que aquelas eleições estão por acontecer e que, em jogo, está o seu voto.

Com a palavra, os candidatos:

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Dois ataques de “angina pectoril” provocados por um intenso esgotamento físico, impediram que o deputado Alfredo Nasser participasse do comício de encerramento, na Praça do Bandeirante. é este o discurso que iria pronunciar o comandante da campanha Otávio Lage:

Amigos

Chego a esta Praça do Bandeirante, num barco acossado e batido pelas vagas e os ventos contrários, provavelmente inutilizado, no plano pessoal, para novas viagens. Mas o barco está em terra firme. A distância percorrida foi longa mas aqui me encontro naquele logradouro onde, antes de se dividirem nas urnas vossas contendas eleitorais, elas já se decidiram, pela voz dos seus oradores, no coração e na inteligência de todos os goianos. Como já se decidiria esta, com a vitória daquele a quem entrego neste momento, com o comando da campanha, que é meu, o comando do Estado, que é do povo: Otávio Lage de Siqueira. Falo somente em nome do povo, porque o povo aqui está ratificando a delegação. É preciso distinguir vitórias eleitorais, na competição democrática as que são episódicas e as separam as épocas as que decorrem de um processo normal e as que explodem da fermentação revolucionária que vem do protesto reprimido, da decepção contida, da liberdade sufocada. Compreendo, assim, porque em Goiás a contra-revolução vem para as ruas, senão com tiros, pelo menos com infâmias, senão com hinos de guerra e por ausência de sentimento cívico, ao menos com canções obscenas, por excesso de sentimento caprino. Em todos os tempos, na história de todos os povos, as capitanias não se emanciparam sem o protesto dos seus donatários, os regimes de força não se deixaram esmagar sem a reação sangrenta dos seus usufrutuários, as colônias só se libertaram sob o fogo cerrado das suas metrópoles, as conquistas democráticas só foram obtidas como as vimos obtendo em Goiás, em trinta anos de constante, fiel, dolorosa pregação, até chegarmos a este final, quando vamos dizer não! Tudo o que passou e saudar em um novo tempo, aquilo que Otávio Lage representa, isto é, um sino que bate saudando na manhã que nasce os tormentos esquecidos da noite. Ontem nos batíamos para que a fúria predatória do poder pessoal se contivesse nos limites mínimos daquilo que constituía uma caricatura do regime democrático. Depois, transposta essa barreira, tornou-se necessário que sobre o alicerce da evolução democrática do Estado, passássemos à fase das realizações práticas, o que só poderia ser conseguido por quem, tendo sorvido o melhor daquela preparação doutrinária, não se tivesse ferido ou magoado nas suas implicações e nos seus espinhos por alguém que não tivesse penetrado o amargo dos aspectos negativos da vida e da política; por alguém que não tendo sofrido os preconceitos e as discriminações, não viessem nem a discriminação, nem o preconceito turvar o seu julgamento e a sua atuação: por alguém que fosse simples como o povo, generoso como os mocos, sem afetação como os humildes, idealista como os estudantes, austero como os pobres, puro como os operários, arrojado como os pioneiros, devotado como os sacerdotes, justo como um cristão e paciente como um professor; Poe alguém que tivesse a contenção dos que cresceram nas virtudes do trabalho, nas dificuldades do cotidiano, nas asperezas dos que desbravam e cultivam o solo, e o povoam e sobre ele criam as riquezas da terra, em suma e para não ir muito longe, por Otavio Lage de Siqueira. Sua candidatura não é uma “revanche”.

Não é uma cruzada sangrenta e punitiva contra as fortificações de uma terra infiel. Não é uma vingança contra o sofrimento imposto à nossa geração. Não é uma desforra, um desafio, uma força para ser armada nas praças públicas. É um protocolo de paz. É o cume de uma escarpa, de onde se descortina o futuro, um futuro liberto do que ficou atrás, esquecido do que foi praticado, despido dos agravos passados que no suor dos que trabalham recolherá a água benta das suas orações e no amor para com todas as palavras com que a terra goiana será abençoada. Essa cruzada de pacificação se completa no impoluto, no autêntico, no homem a quem a terra goiana não pode esquecer, no administrador que deu o Estado o seu impulso decisivo, no patriota silencioso, no trabalhador sem alarde, no político sem interesses secundários, no homem publico de compostura e dignidade exemplares, essa cruzada se completa em José Ludovico de Almeida, se completa em Coimbra Bueno, cujo amor a Goiás é uma religião, cuja devoção aos interesses goianos é uma constante, cuja vocação para o serviço público sempre o trouxe preso aos seus deveres, o verdadeiro, o autentico fundador de Brasília; e se completa em Osires Teixeira, líder intelectual, líder político, líder moral e em São Frederico Nunes, um dos melhores exemplares humanos que já nasceram sob os céus de Goiás e Levertino Leão, combatente da primeira hora, limpo e digno homem do povo, da política e do trabalho. José Ludovico deixa a Câmara para governar Goiânia porque nele o amor ao trabalho supera o amor às posições; porque nele a grandeza, na vida pública, não está no proveito, está no sacrifício. E Goiânia há de compreender isto. Goiânia jamais deixou de compreender. Esta é a nossa Cruzada, porque alguma coisa teria que acontecer em Goiás, fora dos sofrimentos individuais, ao ímpeto da torrente renovadora de uma Revolução, vitorioso desfecho do sonho e do sangue derramado de muitas gerações vencidas, desaguadouro sem reversão do idealismo tantas vezes sufocado dos que, ao longo da república, sempre se opuseram às distorções e deformações do regime, conseqüência inevitável da Constancia no objetivo e da convicção na causa, que só os predestinados tem e só os escolhidos sustentam. Não se fez, neste país, uma revolução, nem ela tem, como chefe, um estadista com o selo moral e patriótico do Presidente Castelo Branco, nem tem ela em Goiás um representante da estatura moral e profissional do Marechal Ribas Junior, para que nada entre nós ocorresse de novo; Então chega. Agora chega. Nunca duvidei de que um dia, um dia de sol, um dia sem nuvens haveria de surgir para os que, como nós, sustentam contra a maré montante da traficância política, com toda a sua arrogância usurpadora, oposição de suas idéias simples e do seu puro coração de humildes cidadãos a serviço da terra goiana.

Agora, o barco se encontra, com o comandante avariado embora, na terra firme. O barco em que vim, amigos, até esta noite, até esta praça. É o barco do comando. Aqui o deixo, com a vitória, em vossas mãos porque a terra é firme, o dia é claro, a estrada ampla. Continuai o caminho com a benção de Deus, a ajuda de Deus, a inspiração de Deus. Na Sua Infinita Misericórdia, Ele vos deu a solução: Otavio Lage, José Ludovico, Coimbra Bueno e Osires e Levertino e Frederico Nunes.

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PEDRO E GOIÂNIA

No começo era apenas uma campina verdejante. O rio Meia Ponte corria mansamente sem que às suas margens se ouvisse outro ruído alem do mugir do gado, ou da algazarra dos pássaros.

A economia de Goiás era uma economia contemplativa. Nos pastos os bois cresciam pachorrentamente. A lavoura mal produzia para o sustento da população, que longe estava de alcançar a casa de um milhão de habitantes.

As famílias mais abastadas mandavam seus rebentos buscar em Uberaba, ou em Silvânia, as luzes de um curso médio. As outras nem chegavam a ter aspiração tão alta.

Nas fazendas imperava um regime de escravidão branca. Com a venda, era vendida a dívida do empregado e a polícia não permitia que este deixasse o patrão sem liquidá-la. E liquidá-la como?

No sudoeste um homem sonhava.

Queria para seu povo o conforto da civilização.

Afinal, se tantas eram as riquezas, se tão rico era o solo, se tão dadivoso o subsolo, se o potencial energético era imenso, se inteligentes eram os homens, porque não progredir?

Como condição básica, a liberdade teria de ser a primeira conquista.

Foi então que Pedro Ludovico Teixeira engajou-se no movimento revolucionário de .

Os fatos, a história registra. A vitória do movimento, a prisão de Pedro Ludovico, sua ascensão ao poder.

Obtidas as primeiras conquistas — o voto secreto e a criação da Justiça Eleitoral — cumpria modificar o panorama econômico do Estado.

Veio então a construção de Goiânia.

A liderança de Pedro já se firmara e contra ela se levantavam os que não queriam o progresso, a libertação do povo, a condenação da oligarquia que há trinta aos detinha o poder, impedindo o progresso de Goiás.

A luta contra a construção de Goiânia foi titânica.

No comando dessa luta, o deputado Alfredo Nasser, ora propondo que a mudança da Capital só se efetivasse depois que a Estrada de Ferro chegasse a Goiás, ora propondo a transformação da nascente cidade de Goiânia em um leprozario, tudo visando impedir o crescimento de uma liderança que ia lançando fundas raízes no coração do povo: Pedro Ludovico Teixeira.

Pois foi exatamente nessa luta que sobressaiu a inteligência privilegiada do líder e a vontade inquebrantável do chefe.

Pedro Ludovico disse que construiria Goiânia e construiu. Disse que tiraria seu Estado do atraso e tirou.

Não foi apenas a campanha impiedosa dos adversários que ele teve de enfrentar. As dificuldades de ordem material também foram imensas. O orçamento de Goiás não ultrapassava a casa dos 6 mil contos anuais, quando Pedro Ludovico empreendeu a tarefa gigantesca de construir uma cidade moderna, no coração da pátria e quanto mais ele demonstrava a sua capacidade de liderança, mais se avilumava o desejo dos seus adversários de destruí-lo.

Mas Pedro Ludovico, que inegavalmente sempre teve perfeita identidade com o povo, encontrou, no apoio deste, a coragem necessária para prosseguir na jornada. Brasileiros de todos os rincões, na sua maioria gente humilde, cerraram fileiras em torno de Pedro Ludovico. Estrangeiros vindos da Síria ou do Líbano, da Itália ou de Portugal, do Paraguai ou de Espanha, sentiram que a edificação da nova cidade marcaria o início de uma nova era para Goiás e também cerraram fileiras em torno do líder mudancista.

No coração dos adversários, entretanto, a idéia de destruir politicamente Pedro Ludovico, continuou crescendo. Passaram-se os anos e veio a Revolução de 31 de março. Os velhos adversários julgaram azado o momento para atingir o grande líder, na pessoa de seu filho, sabendo que então ele estaria sendo duplamente atingido.

O povo manteve invariável a sua fidelidade ao grande líder. Principalmente a gente humilde de Goiânia, que desde a sua fundação sempre procurou a casa de Pedro Ludovico para receber, dele ou de dona Gercina Borges Teixeira, ajuda mateiral ou uma palavra de conforto, na hora da provação política lá estava firme na praça pública para conduzir nos braços o filho de Pedro Ludovico, que acabava de ser deposto pela intervenção federal.

Mais uma vez, os adversários do grande líder estão arregimentados para destruí-lo. Cada palavra dita por ele em praça pública, cada discurso pronunciado em palanque político é imediatamente gravado, para servir de “prova” a um processo, cuja finalidade exclusiva é a destruição do líder popular.

O povo goiano se caracteriza principalmente por suas grandes virtudes: bravura e lealdade.

Aqueles que viram nascer esta cidade, aqueles que estudaram a História de Goiás, sabem que o prestígio de Pedro Ludovico advém da sua grande capacidade de trabalho e da sua inegável vocação de servir. O “crime” que ele cometeu, foi o de querer bem a Goiás e dedicar toda a sua vida ao trabalho do engrandecimento desta terra.

Pedro Ludovico dirigiu uma mensagem ao povo, pedindo o apoio desse aos candidatos do seu partido. Peixoto da Silveira, João Abrão e íris Rezende Machado.

Amanhã, as urnas estarão abertas para receber a resposta do povo.

Recorte de 2 de outubro de 1965

Recorte de 2 de outubro de 1965

Recorte de 2 de outubro de 1965

Recorte de 2 de outubro de 1965