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Os direitos de preferência estabelecidos pela Lei Complementar nº 123/2006 e Decreto nº 7.174/2010

por Ubiratan Cipriano AguiarNota 01

 

1 Introdução

Com objetivo de fomentar a geração de empregos no Brasil, proporcionar o desenvolvimento nacional, com a obtenção de tecnologia própria, bem como contribuir para formação de mão de obra especializada, foram promulgadas várias leis, as quais concederam incentivos fiscais às microempresas e empresas de pequeno porte, indústrias nacionais ou estrangeiras que fabricam peças ou investem em pesquisas no país e empresas que comercializam bens produzidos no Brasil. Na área de licitações públicas, criaram-se vários direitos de preferência, porém, serão objetos de estudo, especificamente, os estabelecidos pela Lei Complementar nº 123, de [Planalto] e Lei Ordinária nº 8.248, de [Planalto], esta última, regulamentada pelo Decreto nº 7.174 de [Planalto]. A grande questão consiste em saber se na aplicação de ambas legislações, uma exclui a outra, ou são sequenciais, casadas, sucessivas e integrativas.


2 Ausência de disposições previstas no Decreto nº 7.174/2010 nos editais

A despeito do tema, ao pesquisar a jurisprudência do Tribunal de Contas da União, constatou-se que vários acórdãos decorreram de representações interpostas por diversas empresas licitantes perante o aludido órgão fiscalizador. Dentre as mais variadas razões, quase todas tiveram como ponto central, a ausência nos editais para aquisição e contratação de bens e serviços de informática e automação de cláusulas e previsões de procedimentos que garantissem a observância do exercício de preferência por parte de fornecedores de produtos com tecnologia desenvolvida no país e/ou produzidos de acordo com o Processo Produtivo Básico (PPB), contrariando frontalmente, os artigos 5º e 8º do Decreto nº 7.174 de . Todas essas representações foram julgadas procedentes. Esta falha restou evidenciada em vários órgãos públicos que deixaram de constar a citada legislação nos instrumentos convocatórios, in verbis:

Art. 1º - As contratações de bens e serviços de informática e automação pelos órgãos e entidades da administração pública federal, direta e indireta, pelas fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público e pelas demais organizações sob o controle direto ou indireto da União, serão realizadas conforme o disciplinado neste Decreto, assegurada a atribuição das preferências previstas no art. 3º da Lei nº 8.248, de 23 de outubro de 1.991, e na Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de de 2006, in verbis:

Art. 5 - Será assegurada preferência na contratação, nos termos do disposto no art. 3º da Lei nº 8.248, de 1991, para fornecedores de bens e serviços, observada a seguinte ordem:

  1. bens e serviços com tecnologia desenvolvida no país e produzidos de acordo com o Processo Produtivo Básico (PPB), na forma definida pelo Poder Executivo Federal;
  2. bens e serviços com tecnologia desenvolvida no país; e
  3. bens e serviços produzidos de acordo com o PPB, na forma definida pelo Poder Executivo Federal.

Parágrafo único. As microempresas e empresas de pequeno porte que atendam ao disposto nos incisos do caput terão prioridade no exercício do direito de preferência em relação às médias e grandes empresas enquadradas no mesmo inciso.

(…)

Art. 8 - O exercício do direito de preferência disposto neste Decreto será concedido após o encerramento da fase de apresentação das propostas ou lances, observando-se os seguintes procedimentos, sucessivamente:

  1. aplicação das regras de preferência para as microempresas e empresas de pequeno porte dispostas no Capítulo V da Lei Complementar nº 123, de 2006, quando for o caso;
  2. aplicação das regras de preferência previstas no art. 5, com a classificação dos licitantes cujas propostas finais estejam situadas até dez por cento acima da melhor proposta válida, conforme o critério de julgamento, para a comprovação e o exercício do direito de preferência;
  3. convocação dos licitantes classificados que estejam enquadrados no inciso I do art. 5, na ordem de classificação, para que possam oferecer nova proposta ou novo lance para igualar ou superar a melhor proposta válida, caso em que será declarado vencedor do certame;
  4. caso a preferência não seja exercida na forma do inciso III, por qualquer motivo, serão convocadas as empresas classificadas que estejam enquadradas no inciso II do art. 5, na ordem de classificação, para a comprovação e o exercício do direito de preferência, aplicando-se a mesma regra para o inciso III do art. 5, caso esse direito não seja exercido; e
  5. caso nenhuma empresa classificada venha a exercer o direito de preferência, observar-se-ão as regras usuais de classificação e julgamento previstas na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e na Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002.

§1º - No caso de empate de preços entre licitantes que se encontrem na mesma ordem de classificação, proceder-se-á ao sorteio para escolha do que primeiro poderá ofertar nova proposta.

(…)

 

3 Dificuldades interpretativas das preferências estabelecidas na Lei Complementar nº 123/2006 e Decreto nº 7.174/2010

Em voto revisor contido no Acórdão nº 4.142/2012 – 2ª Câmara do TCU, o Ministro Augusto Serman Cavalcanti defendeu a tese de haver antinominia entre os artigos 5º e 8º do Decreto nº 7.174 de , resultando na dúvida se a preferência final seria dada a microempresa/empresa de pequeno porte em caso de empate ficto dentro da margem de 10% (dez por cento), pois vejamos transcrições abaixo:

(…) A interpretação aplicada pelo Comprasnet  traz uma duplicidade de direito à ME/EPP. Isso porque, a oportunidade dos benefícios às ME/EPP fornecida pela LC 123 e somente uma vez, não pode ser repetida posteriromente. Se a ME/EPP não exerceu o direito de preferência no momento concedido, nos moldes da LC 123/06, e, então, não usufruído por qualquer motivo o benefício da LC 123/06, a Administração passará a aplicar o benefício do Decreto de Informática, não há que se falar em dar nova preferência às ME/EPP a cada categoria de beneficiados pelo Decreto de Informática. Ou seja, um vez iniciada a aplicação da preferência do Decreto 7.174 de Informática, as ME/EPPs concorrem de igual para igual com as médias e grandes empresas. Nesse sentido:

Vê-se, então, que essa sistemática contraria o § 1º do art. 45 da LC 123/2006, visto restar claro que o direito de preferência fundado no porte da empresa se extingue com o encerramento do procedimento previsto nos incisos do referido artigo 45. Ou seja, como o procedimento para o exercício do direito de preferência das micro e pequenas empresas realiza-se apenas uma vez dentro do certame, extinguindo-se o direito a partir desse ponto, não há como repetir tal procedimento na forma prevista no art. 5º, parágrafo único, do Decreto 7.174/2010. (Sem grifo no original)

O art. 5º, parágrafo único, do Decreto 7.174/2006 também contraria o disposto no art. 3º da Lei 8.248/91, porque a lei não autoriza efetuar diferenciações com base no porte das empresas incluídas em seus incisos. Conclui-se, então, que o parágrafo único do art. 5º, afigura-se ilegal. Já com relação ao art. 8º do Decreto 7.174/2010, verifica-se que a sistemática ali estabelecida coaduna-se com o disposto no art. 45 da LC 123/2006. Isto é, primeiro, aplicam-se as regras relativas ao direito de preferência das microempresas e empresas de pequeno porte; não ocorrendo a contratação dentro deste grupo, passa-se a aplicar as regras atinentes ao direito de preferência dos fornecedores de TI fundado nas caraterísticas dos bens e serviços, sem diferenciação quanto ao porte dos licitantes; não ocorrendo contratação mais uma vez, aplicam-se as regras usuais de licitação. De todo o exposto, tem-se que o conflito existente soluciona-se com a supressão do parágrafo único do art. 5º do Decreto 7.174/2010, visto que tal dispositivo não se conforma com a legislação regulamentada pelo Decreto.(…).

 

4 Particularidades dos cálculos relativos ao direito de preferência estabelecido pela Lei Complementar nº 123/2006 e Decreto nº 7.174/2010

Nos pregões eletrônicos, todos cálculos e procedimentos realizam-se automaticamente pelo COMPRASNETNota 02, condicionados ao cadastramento e preenchimento correto da proposta comercial em campos próprios (Microempresa/ Empresa de Pequeno Porte – SIM/NÃO, Detentor de PPB/Produto produzido por empresa Brasileira – SIM/NÃO)Nota 03, objetivando possibilitar o perfeito funcionamento do software, cujo prazo inicia-se pelo referido sistema, contado após a divulgação do Edital no site: www.comprasnet.gov.br até a data e horário da abertura da sessão pública. Hão de convir, como não poderia ser diferente, que as informações alimentadas no COMPRASNET deverão ser verificadas e checadas pelo Pregoeiro em consultas realizadas no Portal da Transparência, balancetes patrimoniais apresentados na fase de habilitação, na Portaria emitida pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e outros sítios oficiais. Ressalte-se, por oportuno, que o sistema efetua todos os cálculos de forma individualizada. Por outro lado, quando são agrupados em lote, o Pregoeiro deverá fazer o cálculo por item em face de ser impossível o software realizá-lo. Nos dizeres da orientação disponibilizada pelo então Ministério do Planejamento de Orçamento e Gestão, antes da última versão do software: “O pregoeiro deverá aplicar manualmente os benefícios após a fase de lances e antes da aceitação, se necessário, com a suspensão da sessão. Para tanto, deve-se solicitar a auto declaração das licitantes de que possuem certificados por meio de chat”. Este procedimento é o adotado no caso de licitação realizada por lote. As consequências negativas para empresas, caso prestem informações falsas, são várias. Pode se destacar: ficar impedida até 5 (cinco) anos de participar de licitações promovidas por órgãos públicos, nos termos do artigo 7º da Lei nº 10.520 de Nota 04. Em primeiro lugar, aplica-se a Lei das Microempresas (LC nº 123/2006), resultando no ordenamento dos lances que estão na margem de 5% (cinco por cento), quando comparados com o ofertado pela empresa de médio ou de grande porte, chamado de empate fictoNota 05, conforme simulação abaixo:

 

Classificação da empresa Valor do lance
Empresa A (microempresa)Nota 06 R$ 105,00
Empresa B (pequeno porte)Nota 07 R$ 104,00
Empresa C (Empresa de Grande/ou Médio porte)Nota 08 R$ 100,00
Empresa A R$ 99,00

Tabela 1


Convocadas pelo sistema, fixando-se o prazo de 5 (cinco) minutos para que as empresas A e B, caso lhes aprouverem, ofertem lances menores do que o apresentado pela Empresa C. Pode-se questionar se estaria precluso o direito da empresa B em participar da fase de lance novamente, em caso de inabilitação da empresa A, na fase específica e própria. Ao contrário do que se possa imaginar, neste caso exemplificado, a Empresa B volta a disputa, sendo lhe concedido o prazo de 5 (cinco) minutos para cobrir a proposta da Empresa C, visto encontrar-se na margem de 5% (cinco por cento). Findado o prazo para oferecimento de lances, neste caso, a Empresa A sagraria vencedora do certame competitivo, independentemente se existisse ou não empresas detentoras de PPB, ou comercializasse bens produzidos por indústrias brasileiras.

Não havendo contratação sob a égide da Lei Complementar nº 123/2006 [Planalto], passamos para o segundo momento, as empresas possuidoras do TPNota 09 e PPBNota 10, sejam elas, microempresas e empresas ou grandes e médias empresas que comercializam produtos produzidos por indústrias brasileiras ou instaladas no Brasil.

 

Classificação da empresa Valor do lance
Empresa A (microempresa – com PPB)* R$ 105,00
Empresa B (pequeno porte – com TP)** R$ 104,00
Empresa C (Empresa de Grande Porte – com PPB)* R$ 95,00
Empresa B R$ 95,00

Tabela 2

* exercício de preferência para fornecedores de bens e serviços com tecnologia desenvolvida no país e/ou produzidos de acordo com o processo produtivo básico (PPB).

** Comercializa produtos com tecnologia desenvolvida no país.

 

Neste caso, sagrar-se-ia vencedora do processo seletivo a empresa B, porque, embora todas possuem certificados, a Empresa B comercializa produto com tecnologia desenvolvida no Brasil (TP) que sobrepõe o PPB (Projeto de Produção Básica)Nota 11. Nesta situação, prevaleceria o fato dela ser microempresa ou também empresa de pequeno porte, caso venha ofertar valor igual ou inferior ao proposto pela Empresa C.

A situação se complica quando as microempresas e/ou empresas de pequeno porte não comercializem bens de informática possuidores do TP/PPB e concorram com empresas de médio ou grande porte que os têm. Os intervalos a serem respeitados seriam de 10% (dez por cento) na hipótese abaixo aventada:

 

Classificação da empresa Valor do lance
Empresa A (microempresa – sem PPB e outros) R$ 105,00
Empresa B (pequeno porte – sem PPB e outros) R$ 104,00
Empresa C (Empresa de Grande Porte – com PPB)* R$ 100,00
Empresa D (Empresa de Médio Porte – com TP e PPB) R$ 102,00
Empresa A R$ 90,00
Empresa C R$ 90,00
Empresa D R$ 90,00

Tabela 3

 

A oportunidade foi dada para empresa D ofertar o mesmo valor da empresa Microempresa porque encontra-se na margem de 10% (dez por cento) e possui dois certificados (TP e PPB).

 

Empresa A (ME/EPP – com TP) R$ 100,00
Empresa B (ME/EPP – com PPB) R$ 108,00
Empresa C (Média/Grande Porte com TP e PPB) R$ 109,00
Empresa D (Média/Grande Porte com TP e PPB) R$ 110,00
Empresa D (Média/Grande Porte com TP e PPB) R$ 100,00

Tabela 4

 

Neste caso acima, a Empresa D exerceu o direito de preferência estabelecido no Decreto nº 7.174/2010 por possuir 02 (dois) certificados, dando-lhe o direito de cobrir o lance ofertado pela Empresa A no valor igual ou inferior.

 

Classificação da empresa Valor do lance
Empresa A (microempresa – com PPB) R$ 105,00
Empresa B (pequeno porte – com PPB) R$ 104,00
Empresa C (Empresa de Grande Porte – com PPB) R$ 95,00
Empresa A R$ 95,00

Tabela 5

 

Neste caso acima, a empresa A exerceu o direito de preferência estabelecido no Decreto nº 7.174/2010. Embora todas empresas licitantes possuam o PPB, a microempresa, como também a de pequeno porte gozam da preferência de cobrir a proposta de menor valor e sagrar-se vencedora, quando estão nas mesmas condições. Neste caso, o diferencial é ser microempresa ou empresa de pequeno porte.

O então Ministério de Planejamento Desenvolvimento e Gestão baixou instrução com base nos dispositivos legais (Lei Complementar nº 123/2006 e Lei Ordinária nº 8.248/1991 [Planalto]), com respaldo no artigo 5º do Decreto nº 7.174/2010, datada em , no caso em que licitantes se declarem portadores de um ou dois certificados, onde se aplica a seguinte ordem de classificação:

  1. TECNOLOGIA NO PAÍS + PROCESSO PRODUTIVO BÁSICO + MICRO E PEQUENA EMPRESA;
  2. TECNOLOGIA NO PAÍS + PROCESSO PRODUTIVO BÁSICO;
  3. TECNOLOGIA NO PAÍS + MICRO E PEQUENA EMPRESA;
  4. TECNOLOGIA NO PAÍS;
  5. PROCESSO PRODUTIVO BÁSICO + MICRO E PEQUENA EMPRESA;
  6. PROCESSO PRODUTIVO BÁSICO.


Em uma visão minoritária, no exemplo acima descrito (Tabela 3), deveria se oportunizar à empresa A para cobrir a proposta ofertada pela empresa C e, por conseguinte, declarar-se a vencedora do processo seletivo, por se tratar de microempresa/pequeno porte. Ocorrendo o estabelecido na Lei Complementar nº 123/2006, excluiria a aplicação da Lei nº 8.248/1991, mais precisamente do Decreto nº 7.714/2010. Para os adeptos desta opinião, o artigo 5º do referido Decreto daria azo a esta interpretação, a exemplo do ministro do TCU, Augusto Sherman Cavalcanti, nos termos do seu voto proferido, exposto acima. Na verdade, quem se sagra vencedora é a empresa C. Observa-se que nesta hipótese, o exercício da preferência é dado para empresa de médio/grande porte, possuidora do TP e PPB que cobre o lance ofertado pela Empresa A (microempresa), vendedora de produtos estrangeiros.

Extrai-se da simples leitura do artigo 8º do Decreto nº 7.174/2010 que a construção interpretativa foi desenvolvida pelo Ministério de Planejamento e Orçamento e vem sendo adotada por vários órgãos das mais variadas esferas (Municipal, Estadual e Federal), partindo da leitura dos citados dispositivos, com a denominação de “certificados”, pois são estes documentos emitidos por órgãos públicos comprovadores das situações definidas (I - bens e serviços com tecnologia desenvolvida no País e produzidos de acordo com o Processo Produtivo Básico (PPB), na forma definida pelo Poder Executivo Federal; II - bens e serviços com tecnologia desenvolvida no País; e III - bens e serviços produzidos de acordo com o PPB, na forma definida pelo Poder Executivo Federal).

Primeiramente aplica-se a Lei Complementar nº 123/2006 e, caso não haja adjudicação à microempresa/ou empresa de pequeno porte, observa-se o Decreto nº 7.174/2010, cuja empresa subsumida nesta situação será convocada para dar lance igual ou inferior à classificada em 1º (primeiro) lugar. Este é o entendimento defendido pelo Ministro do TCU, Augusto Sherman Cavalcanti, conforme alguns trechos transcritos:

“(…) somente não utilizado o critério de preferência da LC 123/2006, que passa-se à aplicação do critério do Decreto nº 7.174 de Informática (…)”.

Para melhor situar, a propósito, seguem transcrições dos artigos da Lei Complementar nº 123/2006, que diz respeito à matéria, abaixo reproduzidos:

Art. 44. Nas licitações será assegurada, como critério de desempate, preferência de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte.

§1º Entende-se por empate aquelas situações em que as propostas apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte sejam iguais ou até 10% (dez por cento) superiores à proposta mais bem classificada.

§2º Na modalidade de pregão, o intervalo percentual estabelecido no §1º deste artigo será de até 5% (cinco por cento) superior ao melhor preço.

Art. 45. Para efeito do disposto no art. 44 desta Lei Complementar, ocorrendo o empate, proceder-se-á da seguinte forma:

  1. a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada poderá apresentar proposta de preço inferior àquela considerada vencedora do certame, situação em que será adjudicado em seu favor o objeto licitado;
  2. não ocorrendo a contratação da microempresa ou empresa de pequeno porte, na forma do inciso I do caput deste artigo, na forma do inciso I do caput deste artigo, serão convocadas as remanescentes que porventura se enquadram na hipótese dos §§ 1º e 2º do art. 44 desta Lei Complementar, na ordem classificatória, para o exercício do mesmo direito.
  3. no caso de equivalência dos valores apresentados pelas microempresas e empresas de pequeno porte que se encontram nos intervalos estabelecidos nos §§ 1º e 2º do art. 44 desta Lei Complementar, será realizado sorteio entre elas para que se identifique aquela que prieiro poderá apresentar melhor oferta.

§1º Na hipótese da não-contratação nos termos previstos no caput deste artigo, o objeto licitado será adjudicado em favor da proposta originalmente vencedora do certame.

§2º O disposto neste artigo somente se aplicará quando a melhor oferta inicial não tiver sido apresentada por microempresa ou empresa de pequeno porte.

§3º No caso de pregão, a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada será convocada para apresentar nova proposta no prazo máximo de 5 (cinco) minutos após o encerramento dos lances, sob pena de preclusão.

Art. 46. A microempresa e a empresa de pequeno porte titular de direitos creditórios decorrentes de empenhos liquidados por órgãos e entidades da União, Estados, Distrito Federal e Município não pagos em até 30 (trinta) dias contados da data de liquidação poderão emitir cédula de crédito microempresarial.

Art.47. Nas contratações públicas da administração direta e indireta, autárquica e fundacional, federal, estadual e municipal, deverá ser concedido tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica. (Redação dada pela Lei Complementar nº 147, de 2014)

(…)

Extraí-se da simples leitura do artigo 45, II, da Lei Complementar nº 123/2006 que ao se deparar com ausência da situação apontada no predito dispositivo legal, parte-se para aplicação do Decreto nº 7.174/2010. Muitos estudiosos do assunto defendem que esta interpretação afigura-se excludente, porque a aplicação da LC nº 123/2006 elimina o Decreto nº 7.174/2010, invertendo a visão vigorante no país de privilegiar, dentre as políticas públicas implementadas no país, a que mais possui valor agregadoNota 12, defendida com fervor no Ministério do Planejamento e Orçamento e Gestão.

Conforme posicionamento que ainda se encontra em maturação na Secretaria de Logística de Tecnologia da Informação (SLTI) do Ministério do Planejamento, existe uma tendência de aplicação de ambos institutos de forma sequencial (Lei Complementar nº 123 e Decreto nº 7.174/2010, in verbis:

(…) Só que a fórmula de aplicação sequencial é tão complexa que exigirá mudanças estruturais no portal COMPRASNET e isso pode retardar o processo (…).

O entendimento do Ministério do Planejamento é de que todas as preferências sejam aplicadas de forma casada. Para isso estamos regulamentando este entendimento e alterando o Decreto nº 7.174/2010. A norma está em segunda avaliação no departamento jurídico para em seguida ser editada. (…)

No transcurso do Pregão Eletrônico TRE/GO nº 61/2017, cujo objeto consiste na contratação de empresa especializada em fornecimento de equipamentos de informática, foram interpostos recursos alegando em síntese, que não foi respeitado, como critério de desempate, a preferência de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte, conforme estampado nos artigos 44 e 45 da Lei Complementar nº 123/2006. Alegou-se ainda que a LC é hierarquicamente superior ao regramento do Decreto Federal nº 7.174/2010.

A Diretoria-Geral ao enfrentar a matéria, assim se manifestou:

Não haver hierarquia entre lei complementar e lei ordinária, principalmente diante da ausência de dispositivo na Constituição Federal de 1988, que imponha tal hierarquia, há apenas o estabelecimento de um quorum mais qualificado para sua aprovação (maioria absoluta – art. 69) e a delimitação expressa de quais matérias seriam por ela regulamentada.

Sobre o tema, trago à colação os ensinamentos extraídos da obra Curso de Direito Constitucional, autores Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco, publicado pela Editora Saraiva, 7º Edição, págs. 942–943, vejamos:

“A lei complementar se peculiariza e se define por dois elementos básicos. Ela exige quorum de maioria absoluta para ser aprovada (art. 69 da CF) e o seu domínio normativo apenas se estende àquelas situações para as quais a própria Constituição exigiu — de modo expresso e inequívoco — a edição dessa qualificada espécie de caráter legislativo.

Onde, portanto, o constituinte não cobrou a regulação de matéria por meio de lei complementar, há assunto para lei ordinária. Conquanto jurista de nomeada entenda haver hierarquia entre lei ordinária e lei complementar, melhores razões parecem assistir a Michel Temer, quando aponta que não há hierarquia alguma entre lei complementar e a lei ordinária. O que há são âmbitos materiais diversos atribuídos pela Constituição a cada qual destas espécies normativas.

A lei ordinária que destoa da lei complementar é inconstitucional por invadir âmbito normativo que lhe é alheio, e não por ferir o princípio da hierarquia das leis. Por outro lado, não será inconstitucional e a lei ordinária que dispuser em sentido diverso do que estatui um dispositivo de lei complementar que não trata de assunto próprio de lei complementar: O dispositivo da lei complementar, no caso, vale como lei ordinária e pode-se ver revogado por regra inserida em lei ordinária”.

Ao verificar os lances ofertados entre as empresas licitantes, as situações fáticas alegadas nas peças recursais quanto à ausência de aplicação da Lei Complementar nº 123/2006, no exemplo dado na Tabela 1, jamais ocorreram. Em contrapartida, alusiva a aplicação do Decreto nº 7.174/2010, deparou-se com a situação abaixo descrita, pois vejamos:

 

Item 2: impressora laser
Classificação da empresa/nome Valor do lance
EMPRESA REPREMIG (MICROEMPRESA) SEM PPB R$ 772,00
EMPRESA MICROSENS (GRANDE PORTE) COM PPB R$ 809,50
EMPRESA MICROSENS (GRANDE PORTE) COM PPB R$ 771,99

Tabela 6

 

Item 6: impressora multifuncional
Classificação da empresa/nome Valor do lance
EMPRESA DIRECTA (MICROEMPRESA) SEM PPB R$ 1.764,00
EMPRESA MICROSENS (GRANDE PORTE) COM PPB R$ 1.800,00
EMPRESA MICROSENS (GRANDE PORTE) COM PPB R$ 1.763,99

Tabela 7

 

Caso as microempresas REPREMIG e DIRECTA comercializassem equipamentos com PPB, nos itens 2 e 6, gozariam do direito de preferência para cobrir os lances ofertados pela empresa MICROSENS, com valores iguais ou inferiores. Quando a empresa recorrente DIRECTA defendeu a tese de que a Lei Complementar nº 123 deveria prevalecer sobre o Decreto nº 7.174/2010, entrelinhas, advogou também que se deveria conceder o direito de preferência para as Microempresas/Empresas de Pequeno Porte, independentemente de possuírem ou não certificados previstos no referido Decreto.

No caso concreto sob exame, afigurou-se ausente o empate ficto sob a égide da Lei Complemetar nº 123/2006. Na fase de oferecimento de lances, a empresa MICROSENS S/A sempre apresentou os menores lances sem oportunizar às sociedades empresárias REPREMIG e DIRECTA o exercício do direito de preferência, nos termos da expressão utilizada na ata de registro das ocorrências (Não existiram lances de desmpate ME/EPP para os itens 2 e 6).

 

5 Conclusão

Respeitadas as opiniões divergentes das contidas no presente trabalho, o Decreto nº 7.174/2010 tratou da matéria de forma a privilegiar as empresas que comercializam bens de informática produzidos por fábricas brasileiras ou utilizam-se de componentes aqui produzidos, todas situações reconhecidas por certificados emitidos por órgãos oficiais, adotando-se variáveis para se estabelecer os maiores valores agregados possíveis, inspirado no artigo 3º da Lei nº 8.666, de [Planalto] e suas alterações posteriores: “promoção do desenvolvimento nacional sustentável”. É indiscutível que o número de postos de trabalho, de mão de obra especializada com os incentivos fiscais obtidos com os direitos de preferência estabelecidos pelo Decreto nº 7.174/2010 são maiores, quando comparados aos estabelecidos pela Lei Complementar nº 123/2006. A partir deste entendimento subsidiou o legislador a dar maior ênfase às leis de proteção aos bens de informática produzidos no Brasil do que da legislação de proteção às microempresas e empresas de pequeno porte, como exemplo clássico de políticas públicas implementadas, como dito antes, para gerar empregos e mão de obra especializada, objetivando a promoção do desenvolvimento nacional sustentável dentro do contexto sócio-econômico.

 

Bibliografia

 

Nota 01 Técnico Judiciário do Tribunal Regional Eleitoral. Graduado em Direito pela então Universidade Católica de Goiás. Pós graduado em Processo Eleitoral pela Universidade Federal de Goiás. Pós graduado em Gestão Pública pela Uni-Anhannguera. Pós graduado em gestão publica pelo AXIOMA JURÍDICO.

Nota 02 O Comprasnet, desenvolvido para atender a Administração Federal, os Fornecedores e a Sociedade, visa dotar a Administração Pública de um conjunto de ferramentas da tecnologia da informação, voltadas à gestão das compras e dos contratos firmados entre órgãos governamentais e fornecedores de bens e serviços.

Nota 03 Senhor fornecedor, assinale sim para a declaração abaixo, caso seja microempresa, empresa de pequeno porte ou cooperativa e deseje usufruir do tratamento estabelecido nos artigos 42 a 49 da Lei Complementar nº 123 de para esse Pregão Eletrônico, caso contrário assine não.

Nota 04 Art. 7º Quem, convocado dentro do prazo de validade da sua proposta, não celebrar o contrato, deixar de entregar ou apresentar documentação falsa exigida para o certame, ensejar o retardamento da execução de seu objeto, não mantiver a proposta, falhar ou fraudar na execução do contrato, comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude fiscal, ficará impedido de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios e, será descredenciado no Sicaf, ou nos sistemas de cadastramento de fornecedores a que se refere o inciso XIV do art. 4º desta Lei, pelo prazo de até 5 (cinco) anos, sem prejuízo das multas previstas em edital e no contrato e das demais cominações legais.

Nota 05 Quando o intervalo entre o valor ofertado pela empresa licitante de pequeno porte ou grande porte encontrar-se 5% (cinco por cento) acima de acordo com a Lei Complementar nº 123/2006 e 10% (dez por cento) no intervalo entre as empresas, caso da aplicação do Decreto nº 7.174/2010.

Nota 06 Pode ser considerada como microempresa aquela que tenha receita bruta anual igual ou inferior a R$ 360 mil, e empresa de pequeno porte aquela que tenha a receita bruta anual superior a R$ 360 mil e igual ou inferior a R$ 3,6 milhões.

Nota 07 Pode ser considerada como microempresa aquela que tenha receita bruta anual igual ou inferior a R$ 360 mil, e empresa de pequeno porte aquela que tenha a receita bruta anual superior a R$ 360 mil e igual ou inferior a R$ 3,6 milhões.

Nota 08 Acima destes valores são consideradas de médio e grande porte.

Nota 09 Produtos com Tecnologia desenvolvida no Brasil.

Nota 10 O Processo Produtivo Básico (PPB) foi definido por meio da Lei nº 8.387, de , como sendo "o conjunto mínimo de operações, no estabelecimento fabril, que caracteriza a efetiva industrialização de determinado produto".

Nota 11 Em resumo, o PPB consiste de etapas fabris mínimas necessárias que as empresas deverão cumprir para fabricar determinado produto como uma das contrapartidas aos benefícios fiscais estabelecidos por lei. Os PPB são estabelecidos por meio de Portarias Interministeriais, assinadas pelos Ministros da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) e da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).

Nota 12 Valor econômico adicionado ou simplesmente valor adicionado ou, ainda, valor agregado é uma noção que permite medir o valor criado por um agente econômico. É o valor adicional que adquirem os bens e serviços ao serem transformados durante o processo produtivo.