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Revista Jurídica Verba Legis

Verba Legis 2015

sumário

Memória da Justiça Eleitoral

 

 

A Justiça Eleitoral foi criada em 1932, mas no período denominado Estado Novo (1937 - 1945), foram interrompidas suas atividades.

No ano de 2015, são comemorados os 70 anos da redemocratização e reinstalação da Justiça Eleitoral no Brasil. A fim de destacar a importância desse fato histórico, esta edição apresenta texto extraído da página do TSE na Internet .: relativo a dois importantes períodos eleitorais da história do Brasil.

 

 

HIATO ELEITORAL (1937-1945)

 

Em 10 de novembro de 1937, sustentado por setores sociais conservadores, Getúlio anuncia, pelo rádio, a "nova ordem" do país. Outorgada nesse mesmo dia, a "polaca", como ficou conhecida a Constituição de 1937, extinguiu a Justiça Eleitoral, aboliu os partidos políticos existentes, suspendeu as eleições livres e estabeleceu eleição indireta para presidente da República, com mandato de seis anos. Essa "nova ordem", historicamente conhecida por Estado Novo, sofreu, entretanto, a oposição dos intelectuais, estudantes, religiosos e empresários.

Durante dez anos, de 1935 a 1945, não houve eleições no país. Apenas em 28 de maio de 1945 é que a Justiça Eleitoral foi reestabelecida por meio do Decreto nº 7.586 (CARDOSO, 2011). Nesse ano, Getúlio anuncia eleições gerais e lança Eurico Gaspar Dutra, seu ministro da Guerra, como seu candidato. Oposição e cúpula militar se articulam e dão o golpe de 29 de outubro de 1945. Os ministros militares destituem Getúlio e passam o governo ao presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares, à época também presidente do TSE, até a eleição e posse do novo presidente da República, o general Dutra, em janeiro de 1946.

Durante esse hiato eleitoral a ênfase na relação cidadão/eleitor deslocou-se para relação cidadão/trabalhador. O exercício da cidadania e a integração na comunidade nacional enquanto brasileiro dependia diretamente da participação no mundo do trabalho. Ser cidadão e, portanto, brasileiro, era ser trabalhador.

O Estado Novo possuía um objetivo do qual, podemos dizer, derivam todas as importantes características desse regime. Tal objetivo pode ser formulado como a intenção de reformar o Estado com vistas ao desenvolvimento econômico e à disciplinarização da força de trabalho. Em torno dele, se articularam determinados elementos, a saber: uma nova concepção de cidadania; o anti-liberalismo; a legislação trabalhista, a representação política do líder e as de nação e progresso.

Com esse intuito de reforma do Estado, questionou-se a igualdade perante a lei proposta pelo liberalismo, repensando-se assim o significado de democracia e substituindo-se o cidadão/indivíduo pelo cidadão/trabalhador. Os ideólogos do Estado Novo afirmavam que os ideais de equidade, o não intervencionismo estatal e a valorização do individualismo propostas pelo liberalismo acabaram criando uma ordem social de novos privilégios políticos e profundas desigualdades.

Assim, apesar de o liberalismo estabelecer uma igualdade jurídica, constatava-se a inexistência de uma igualdade de condições entre os homens. Nesse sentido, propunha-se uma nova democracia preocupada não com a liberdade, mas com a justiça; não uma democracia política, mas sim social e econômica. As bases desse novo Estado deveriam fundar-se numa compreensão de sociedade como totalidade, como "organismo", no qual as partes deveriam se harmonizar. Essa representação da sociedade abolia a noção de direitos políticos em favor da prestação de deveres determinados pelo Estado.

Essa nova orientação culminava numa política intervencionista do Estado preocupado em promover a ordem e harmonia social que possibilitaria a implementação dessa nova democracia. Nesse quadro, o cidadão definir-se-ia, doravante, pela posse de direitos sociais e não mais pela posse de direitos civis e políticos. A posse desses direitos sociais seria garantida a partir da relação cidadão/ trabalhador, ou seja, para tornar-se digno da condição de cidadão e da proteção social é preciso prestar serviços à pátria, é preciso ser socialmente útil ao Estado.

Ser cidadão, ou seja, participar do mundo político, era pertencer a uma totalidade econômica - por meio do trabalho e da produção de riqueza; jurídica - possuindo uma carteira de trabalho; e moral - entendendo que o trabalho é um dever/direito. Não pertencer a esse corpo social, não trabalhar, constituía-se em crime - as greves e quaisquer outras perturbações no exercício do trabalho eram proibidas. Estar nessa condição era estar no lugar do não cidadão.

Dessa forma, participando do mundo político, prestando serviços à pátria o cidadão/trabalhador fortalecia o Estado e engrandecia a nacionalidade. O bom brasileiro, pois, era aquele que trabalhava pela grandeza do Brasil, que reconhecia a nação como uma entidade superior aos indivíduos. Exemplo disso foi o apelo ao patriotismo dos brasileiros durante a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, lembrando aos cidadãos que deveriam se sacrificar pelo país. O bom brasileiro era responsável pelo progresso da nação.

Assim, promover o homem brasileiro e defender a paz e o progresso do país por meio da transformação do homem em cidadão/trabalhador capaz de produzir sua riqueza individual e também do conjunto da nação tornou-se uma meta do Estado. O trabalhismo constituiu-se então um dos traços definidores da política varguista. A questão do trabalho ganhou certo relevo, instituindo-se uma legislação trabalhista, a qual mediava as relações entre governantes e governados.

A instituição dessa legislação acabou por atribuir à imagem do presidente uma ideia de generosidade. As concessões feitas às classes trabalhadoras eram encaradas pela sociedade como uma dádiva concedida ao povo pelo presidente. Este estaria então cumprindo o seu dever, o qual era garantir a justiça social. Constituía-se assim, a representação de Vargas como "pai dos pobres". Os trabalhadores possuíam com o chefe da nação uma relação de caráter pessoal, pois se identificavam com o "pai trabalhador": este era também um trabalhador da e para a nação; entretanto, era hierarquicamente superior aos demais, pois possuía maiores responsabilidades em relação ao coletivo.

O Estado Novo sustentou-se a partir da articulação e integração desses elementos acima citados. Com o objetivo de reformar o Estado para um progresso material da nação, organizou-se uma nova concepção de democracia e cidadania marcadamente baseadas na ideia de valorização do trabalho. Todos os valores caros ao novo regime relacionados ao novo cidadão/trabalhador cristalizavam-se na imagem de Getúlio Vargas, um exemplo para toda a nação.

 

 

A ERA DOS PARTIDOS POLÍTICOS NACIONAIS (1945-1964)

 

Num contexto de combate internacional contra os regimes nazi-fascistas, o Estado Novo começou a sofrer pressões para um abrandamento do autoritarismo vigente. A entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial ao lado dos Aliados trouxe uma situação contraditória para o regime. Se, por um lado, o estado de guerra poderia justificar a sustentação de um regime autoritário e a promulgação da Constituição de 1937, por outro, trouxe contestações contra a ditadura por parte da sociedade, colaborando para a crise e queda do Estado Novo em outubro de 1945.

A partir de 1943, as pressões da oposição e de grupos da sociedade civil se intensificaram, ocorrendo passeatas, organizadas pelos estudantes da UNE, contra o nazi-fascismo. Diante disso, Vargas assegurou que após o término da guerra empreenderia a normalização da vida política do país. O país vivia momentos de tensões políticas, tornando-se praticamente insustentável manter a unidade da base social do regime. Assim, cisões e divergências internas começaram a emergir.

Como reação, o governo, por meio da Lei Constitucional nº 9, estabeleceu a realização de eleições, marcadas para 90 dias depois. Em maio do mesmo ano, foi decretado o segundo Código Eleitoral. As eleições para Presidente da República e para o Parlamento Nacional deveriam ser realizadas no dia 2 de dezembro daquele ano, e em maio do ano seguinte proceder-se-iam as eleições para os governos e Assembleias Estaduais.

Entretanto, setores da oposição e parte da elite estadonovista temiam que Vargas planejasse ainda manter-se no poder. Temiam, igualmente, seu prestígio junto às forças populares. Diversas articulações foram feitas para afastar o ditador, o mais rápido possível, do poder. Assim, em 29 de outubro, Getúlio Vargas foi deposto pelo Alto Comando do Exército, retirando-se, temporariamente, do cenário político. Em seguida, José Linhares, presidente do Supremo Tribunal Federal, assumiu a presidência da República, para transferi-la, em janeiro de 1946, ao candidato então eleito, Eurico Gaspar Dutra.

 

 

A volta da Justiça Eleitoral

 

Foi nesse cenário político que a Justiça Eleitoral foi reinstalada definitivamente. O Código Eleitoral de 1945, conhecido como Lei Agamenon, restabeleceu a Justiça Eleitoral, regulando em todo o país o alistamento eleitoral e as eleições nota 01. Sua principal novidade foi a obrigatoriedade de os candidatos estarem vinculados a partidos políticos. A obrigatoriedade do voto consta desde 1935, entretanto, nenhuma eleição ocorreu sob a vigência do Código de 1935. Em 1945, a obrigatoriedade foi resgatada no texto da Lei nº 7.586. Doravante, todos os que fossem aptos para o exercício do voto seriam obrigados a exercer esse direito, fossem homens ou mulheres (a menos que fossem mendigos, alguns tipos específicos de militares, inválidos, maiores de 65, magistrados, funcionários públicos que estivessem viajando de férias ou mulheres que não possuíssem profissão lucrativa - art. 4º). Outra inovação foi a redução da idade mínima de 21 para 18 anos, o que acabou gerando uma certa ampliação do eleitorado. Apesar disso, o eleitorado que compareceu às urnas em 1945 para escolher o presidente da República ainda era pequeno (apenas 15 % da população total), o que talvez fosse explicado pela manutenção da vedação ao voto do analfabeto.

O Código garantiu definitivamente o sistema proporcional, sendo os eleitores os responsáveis pela ordem dos candidatos eleitos (modelo de lista aberta). Apresentados os candidatos, os eleitores votavam somente em um nome, possuindo liberdade de escolha no quadro dos partidos. Isso significava que ao votar em um nome, o eleitor estava votando no partido, apenas estabelecendo o nome de sua preferência como o primeiro lugar da lista. Quando votava apenas na legenda, o eleitor votava na lista que todos os outros candidatos estavam compondo. Somavam-se os votos recebidos e dividia-os pelo quociente eleitoral. As cadeiras restantes eram preenchidas pelo partido mais votado.

A Lei Agamenon também mantinha a possibilidade de qualificação e inscrição do eleitor ex officio, ou seja, estavam autorizados a realizá-las os chefes de repartições públicas - mesmo de entidades autárquicas, paraestatais ou de economia mista - e os titulares das seções da Ordem dos Advogados e dos conselhos regionais de Engenharia e Arquitetura. Além disso, o Código de 1945 trouxe disposições específicas que visavam garantir o sigilo do voto, dentre as quais está o emprego de sobrecartas oficiais, uniformes e opacas. No mesmo sentido de moralizar os pleitos, o Código determinava que o cidadão, caso se inscrevesse mais de uma vez com vistas a burlar o processo eleitoral, se submeteria à pena de detenção de três meses a um ano; se tentasse votar mais de uma vez ou votar no lugar de outro eleitor, a pena seria de detenção de seis meses a um ano.

O trabalho que vinha pela frente era grande. Afinal, da data em que foi publicado o Código Eleitoral (28/5/1945) até o dia do pleito para cargos federais (2/12/1945) eram menos que 200 dias, pouco mais de seis meses. Além disso, a Resolução nº 1 do TSE fixava o dia 2/7/1945 como início do alistamento dos eleitores, para o que recomendava que todos os tribunais regionais estivessem instalados até o dia 16/6/1945. Essa ordem começou a ser cumprida e os tribunais regionais começaram a ser instalados: em São Paulo, em 6/6/1945; na Bahia, em 8/6/1945; no Pará, em 6/6/1945; e no Rio Grande do Sul, em 8/6/1945.

Promulgada a Constituição, em 18 de setembro de 1946, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal passaram a funcionar como Poder Legislativo ordinário. A Constituição, a exemplo da de 1934, consagrou a Justiça Eleitoral entre os órgãos do Poder Judiciário e proibiu a inscrição de um mesmo candidato por mais de um estado. Ademais, confirmou a proibição do direito de voto ao analfabeto, restringindo significativamente a cidadania, já que, em 1950, 48% da população adulta não sabia ler nem escrever (CANÊDO, 2008, p. 539).

Em 1950, um novo Código foi promulgado, vigente até 1964. O Alistamento deixou de ser ex officio, tornando obrigatória a retirada do título eleitoral para todo cidadão maior de 18 anos. Em 1955, a Lei nº 2.250 criou a folha individual de votação, que fixou o eleitor na mesma seção eleitoral e aboliu, entre outras, a fraude do uso de título falso ou de segunda via obtida de modo doloso. No mesmo ano, a Lei nº 2.582 criou a cédula de votação oficial, embora fosse facultado aos partidos políticos fabricar e distribuir cédulas de acordo com o modelo enunciado pela lei. A cédula oficial guardou a liberdade e o sigilo do voto, facilitou a apuração dos pleitos e contribuiu para combater o poder econômico, liberando os candidatos de vultosos gastos com a impressão e a distribuição de cédulas.

 

 

Era das campanhas eleitorais

 

Com o fim do Estado Novo, e o estabelecimento pelo Código Eleitoral da exclusividade dos partidos políticos na apresentação das candidaturas, houve a criação de inúmeros partidos, entre os quais os principais partidos políticos brasileiros atuantes da década de 1940 à de 1960: a União Democrática Nacional (UDN), o Partido Social Democrático (PSD) e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Doravante começa-se a construir uma nova e intensificada relação entre os partidos - que precisavam dos votos - e os eleitores - que estavam agora obrigados a votar. Outra relação se estabeleceu também entre os diferentes partidos já que estes precisavam aumentar sua "audiência" para manterem-se na concorrência. Segundo Letícia Bicalho Canêdo, os partidos passaram a ter um papel fundamental na mobilização eleitoral.

Isso porque eles traziam um interesse específico pelas questões políticas. Votar segundo a autora passou a ser a capacidade de qualificar candidaturas politicamente construídas. Assim, surgiu a necessidade de se construir uma "popularidade eleitoral" (CANÊDO, 2008, p. 538). Abriu-se então um leque de novas práticas relacionadas a essas necessidades. Por exemplo, os panfletos de manifestos políticos passaram a ser panfletos de propaganda, os comícios microfonados se tornaram parte do cenário urbano, os candidatos começaram a distribuir apertos de mão e sorrisos. Nesse aspecto, nota-se uma preocupação cada vez maior dos candidatos com suas imagens.

Buscou-se com isso por promover a aglutinação da movimentação política em função das plataformas e projetos de cada grupo. Algo interessante decorreu a partir daí. Essa aglutinação de parcelas da população formou um verdadeiro universo de identidades sociais, relacionadas às associações político-partidárias e seus símbolos. Quer dizer, é com base nessa formação de identidades que foi possível, nos tempos mais recentes, pessoas se declararem petistas, peemedebistas, tucanas, entre outras coisas, e que elas se movam dentro dessas significações compartilhadas, adotando posturas e práticas de acordo com o seu alinhamento político-partidário.

"Pela primeira vez, segundo Jorge Ferreira, "surgiram e fortaleceram partidos políticos nacionais com programas ideológicos definidos e identificados com o eleitorado"nota 02. Para o autor, mesmo enfrentando dificuldades, essa experiência foi privilegiada, já que combinaram-se a "ampliação dos direitos políticos dos cidadãos, a nacionalização dos partidos políticos e um rápido processo de urbanização que emancipou politicamente amplos contingentes da população"nota 03. Houve na sociedade brasileira desse período, de acordo com Jorge Ferreira citando Ângela de Castro Gomes, um aprendizado da política eleitoral fundados em novos e mais amplos marcos.

 

 

O cidadão-eleitor

 

A obrigatoriedade do voto, nesse período, fez parte da tentativa de engajar uma população - ainda muito distanciada das estruturas e identidades nacionais - a um projeto de nação. Mas como convencer tal população de que ela deveria integrar um todo maior, uma comunidade imaginária, ou seja, um Estado Nacional? Para isso, seria necessário persuadi-la sobre a ideia de que, na qualidade de cidadãos e cidadãs, todos precisavam participar do jogo político necessário à construção de um país democrático.
Ser cidadão, nessa época, era o poder-dever de escolher seus representantes. A superposição desses dois personagens - o eleitor e o cidadão - num único indivíduo acarretou a disciplinarização das expressões políticas em torno do calendário eleitoral. Em outras palavras, buscava-se direcionar as expressões políticas para os aparatos eleitorais, tornando cada vez mais distante do ideário do Estado daquela época a possibilidade de entender como cidadãs outras práticas políticas (grandes comoções populares, barricadas…) que não aquelas abrigadas pelo sistema eleitoral oficial.

 

Fonte: www.tse.jus.br/institucional/museu-do-voto/historia-e-memoria.:

Nota 01 Esse Código orientou a eleição para Assembleia Nacional Constituinte de 1945 e as eleições diretas para todos os cargos nos três níveis de governo.

Nota 02 Jorge Ferreira. A experiência democrática de 1946-1964. Disponível em: www.brasilrepublicano.com.br/files/1946-1964.pdf.:. Acessado em: 3 de maio de 2012.

Nota 03 Jorge Ferreira. A experiência democrática de 1946-1964. Disponível em: www.brasilrepublicano.com.br/files/1946-1964.pdf.:. Acessado em: 3 de maio de 2012.